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Há quem torça o nariz para a expressão “jazz brasileiro”. Para alguns, é uma forma pretensiosa de se esquivar do inevitável samba, gênero que representaria o anseio por uma expressão da musicalidade nacional. Nos livros de história, a dúvida sempre surge no capítulo dedicado à bossa nova, invenção que os americanos surrupiam pelo nome de “cool jazz”. Nesse caso, a bossa nova, para desespero de tantos outros, seria puramente samba.
São tensões que o tempo não resolveu, agora diluídas, ao sabor da globalização, em “Brazilian Match”, do compositor Luiz Millan. É o quinto álbum dele, o primeiro lançado pelo selo americano Jazz Station Records.
Millan reúne um time de músicos brasileiros e estrangeiros, entre eles os guitarristas Barry Finnerty, de Miles Davis, e John Tropea, de John Lennon, além do trompetista Randy Brecker, sete vezes vencedor do Grammy.
Ao todo, são 16 faixas, cada uma delas com uma formação particular. A obra parece um experimento de engenharia, sendo concebida em diferentes estúdios, entre Japão, França, Itália e Estados Unidos. Se analisado como um todo, o disco evidencia a importância do jazz para os brasileiros, sobretudo no modo de pensar a prática musical. Um exemplo simples. Os medalhões da MPB são todos rodeados por músicos de jazz.
De todo modo, em “Brazilian Match” o interesse está nas nuances, faixa a faixa. À primeira audição, a qualidade dos músicos impressiona e até reconforta, num mundo em que a indústria regurgita produtos, mês a mês, em que ninguém toca nenhum instrumento.
O artista valoriza a técnica, no entanto. Lá está a o solo da guitarra de Tropea, emudecendo a voz de Millan, em “Pacuíba”, sua parceria com Jorge Pinheiro.
O esmero se confirma em “Full Moon”, escrita com Pinheiro e Peter Eldridge, e seu arranjo para o New York Voices, um conjunto vocal americano. A depender do andamento, caímos no samba de “Andar Descalço” ou tropeçamos na bossa “In The Grove of the Jacarandas”.
Nessa última faixa, a contradição adquire graça, quando a cantora Ellen Johnson pronuncia “jacarandás” com o “r” retroflexo, denunciando o encontro de uma gringa com a natureza brasileira. Já instrumental “Madrugada” agrada pela ambiência pacificadora da noite, resultado de uma combinação entre vibrafone e piano. O clarinete de Eddie Daniels, que conduz o tema principal, faz com que “Madrugada” seja o maior acerto do disco.
Psiquiatra, Millan só queria saber de tocar nos saraus da Universidade de São Paulo. Da época da faculdade, surgiu o LP “Ponta de Rama”, em parceria com Pinheiro. O artista sempre transitou entre o universo do samba e do jazz, adquirindo agora notoriedade em veículos de imprensa especializados.
Outros trabalhos de sua autoria são “O Dia em que São Paulo Floresceu”, de 2014, e “Achados & Perdidos”, lançado há quatro anos.
Há problemas em “Brazilian Match”. Não se nega sua qualidade sonora, mas o disco não comove, o que nada tem a ver com a interpretação. A maioria das composições não têm força poética, no caso de letras pobres e permeadas por clichês, que tentam indicar uma aderência à cultura brasileira, como em “Morungaba” —”Tem ipê branco, tem jasmim/ Tem manacá e hortelã/ Tem pau-brasil, tem flamboyant.”
Do mesmo modo, as criações do autor carecem de expressão artística, oferecendo solos sofisticados, mas poucos temas sedutores.
Nesse sentido, o álbum esboça vitalidade em alguns momentos. Por exemplo, em “Que Os Ventos Limpem Os Tempos”, uma letra de Márcia Salomão, com uma formação de cordas ao modo camerístico, bem dramático. Ou em seus acenos à tradição francesa, como ocorre em “Montparnasse”. “Brazilian Match” é um disco interessante e arrojado; poderia ser mais emotivo, no entanto.
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Fonte: Uol