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É possível decidir não tratar de um tema extremamente relevante no intuito de evitar que ele seja esvaziado? Sim, mas toda decisão traz consequências. Saber quando e como articular os conhecimentos adquiridos requer paciência, pragmatismo, comprometimento e método. Praticamente tudo o que os tempos atuais evitam ou não demandam no âmbito da comunicação social —e digital.
Não são poucas nem raras as vezes em que se veem temas de grande relevância social sendo tratados como se em mesas de bar estivessem, nas quais o compromisso maior é com a liberdade de ser quem mistura catarse a fatos sem obrigação de fazer real sentido. A liberdade de não fazer sentido tentando parecer que há algum.
Os interlocutores têm o hábito de transpirar embriaguez ao relatar, com hálito de grandeza digno das maiores epopeias, conceitos sem fundamentação; práxis sem teoria. Constrói-se uma narrativa fantasiosa, baforada pelos dragões da intelectualidade e suas inquietas e criativas chamas do devir, que, entre um gole e outro, fabulam a condição de heróis. Para o bem ou para o mal, é bar. Conversa de bar.
A preocupação vem quando essa mesma imagem se transporta para espaços de grande impacto na formação e reformulação das pautas de interesse público e aos objetivos concretos quanto ao que, de fato, deve ser levado a sério para promover avanços na sociedade. Espaços estes que vão desde cenas de novela, criação de conteúdos para redes sociais, podcasts e palestras, até manchetes, editoriais, colunas e realities shows que atingem milhões de pessoas.
Sabe-se que a falta de rigor e a estratégia explícita de mercado que tenta transformar temáticas sociais e políticas em publicidade prejudicam muito o trabalho realizado por movimentos sociais, professores, organizações autônomas, veículos de comunicação independentes e educadores preocupados com o aprendizado emancipador. Sabe-se ainda que as consequências da banalização das pautas que visam combater as desigualdades sociais em todas as camadas —ou estratificações— se revelam o absoluto contrário: a acentuação dos contrastes que aniquilam as populações mais vulneráveis.
Amanhece o dia. As notificações de todos os lados cantam mais do que os raríssimos galos que ainda podem ser ouvidos entre uma quebrada e outra. Na rede social: racismo explicado e resolvido em 15 minutos, gordofobia conceituada e simplificada em três postagens, teoria política, teoria da comunicação, filosofia, psicologia, todas abordadas separadamente entre uma propaganda de podcast e outra. Há resposta para tudo e todos, pode-se escolher na prateleira e ser feliz —ou infeliz, mas irrefutável. Resolvem-se em apenas 4.000 toques os problemas econômicos estruturais do país, sempre com aquele sarcasmo detectável —o que faz dele nada sarcástico pela falta de sutileza e excesso de arrogância. Escreve-se sobre minorias sociais como se todas fossem uma só: um só pobre, um só negro, um só indígena. Ainda perturbam a empregada doméstica perguntando em quem ela irá votar nas disputas eleitorais, mas nunca o que pensa sobre o salário que recebe.
Para completar a espetacularização da real tragédia social vivida todos os dias, cria-se uma estrutura de comunicação em que se faz parecer que qualquer assunto visto como “progressista” é de alçada do que se acha entender por “esquerda”. Enquanto isso, por trás do palco, onde a vida concreta se apresenta sem alegorias, organizações autônomas e muitos agentes políticos e culturais lutam arduamente para não serem confundidos com personagens de uma encenação por si só decadente. Nem esquerda, nem direita: fundão. Lá estão os que são.
Telas cheias de conteúdo, a todo momento, sempre curtos querendo ser grossos o bastante para fingir sustância, é assim que se esvaziam, hoje, temas importantes. Perde-se o entendimento sobre as complexidades dos aspectos críticos da sociedade que demandam desta mais do que entretenimento. Demandam conhecimento sobre a real proporção dos problemas enfrentados e vividos.
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Fonte: Uol