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Ministério Público abriu inquéritos para investigar denúncias de que os prédios foram construídos com altura máxima acima do permitido pela legislação. Orla de João pessoa em vista aérea
Paulo Cavalcanti/Arquivo Pessoal
Quatro inquéritos abertos pelo Ministério Público da Paraíba (MPPB) investigam denúncias de que edifícios foram construídos, ou estão em construção, com altura máxima acima do limite permitido para a orla da capital. Atualmente, estão em vigor duas leis, uma estadual e outra municipal, que impedem a existência dos chamados “espigões” na faixa de 500 metros da orla marítima, que causam danos ao meio ambiente.
O g1 teve acesso aos detalhes dos inquéritos e mostra os três prédios que tiveram as irregularidades constatadas, além de mais um que ainda está em processo de construção, mas com indícios de que deve ultrapassar o limite, após finalizado.
As construções alvo do MPPB são:
Bossa Design Hotel – Bossa Design Empreendimento de Hotelaria LTDA
Jady Miranda – Porto Bello Empreendimentos Imobiliários SPE LTDA
Edíficio Setai Edition – Construtora Guedes Pereira
Edifício Mindset – Construtora Equilíbrio
Edifício Mindset
Mindset é um dos prédios alvos de investigação do MPPB
Divulgação
O edifício Mindset está sendo construído na Avenida Ingá, no bairro de Manaíra. O inquérito foi aberto em 23 de maio de 2023, após uma denúncia feita na ouvidoria do MPPB.
Conforme o inquérito, após a denúncia, o órgão solicitou um relatório à Secretaria Municipal de Planejamento (Seplan), que indicou que o edifício teve o alvará de construção aprovado em 2019, com altura de 28,15 metros, estando, portanto, dentro do previsto para a área onde ele está, que é de 28,96 metros, no máximo.
Porém, após a realização do processo de “as built” — documento que detalha a construção exatamente como foi feita, e que pode ter divergências do projeto inicial —, ficou constatado que a altura final do Edifício Mindset é de 31,40 metros, após o acréscimo de partes estruturais dos pavimentos que não haviam sido computadas.
A Construtora Equilíbrio, responsável pela obra, encaminhou um parecer técnico ao MPPB avaliando a possibilidade de mudança estrutural e disse que seria “completamente inviável” realizar a demolição da parte excedente, de 2,44 metros.
Procurada para falar sobre a investigação, a empresa disse que o Sindicato da Indústria da Construção Civil de João Pessoa (Sinduscon-JP) deveria falar sobre o assunto (veja mais abaixo).
Edifício Setai Edition
Edíficio Setai está na lista de investigação do MPPB
Reprodução/TV Cabo Branco
O edifício Setai Edition está sendo construído na Avenida Cabo Branco, no bairro de Cabo Branco. O inquérito foi aberto em no final de 2021, após uma denúncia anônima.
Conforme o inquérito, após a denúncia, uma visita técnica foi feita por engenheiros do MPPB, em 1º de julho de 2022. No local, o engenheiro constatou que o edifício ultrapassou a altura máxima permitida, de 12,90 metros, em 1,32 metros, estando com altura total de 14,27 metros.
A Seplan foi notificada pelo MP e informou que a obra possui um alvará de construção assinado e aprovado em 2020, mas que após uma vistoria constatou-se que existiam divergências entre o projeto aprovado na Prefeitura e o que estava sendo edificado no local.
Foi expedida uma notificação à empresa para regularização da obra e, após não cumprimento da determinação, a prefeitura lavrou autos de infração e um termo de embargo da obra.
A empresa disse que segue averiguando os fatos e prestando todos os esclarecimentos necessários aos órgãos competentes.
Edifício Bossa Design Hotel
Bossa Design Hotel está sendo construído na orla de João Pessoa
Reprodução/TV Cabo Branco
O edifício Bossa Design Hotel está sendo construído na Rua João Maurício, em Manaíra. O inquérito foi aberto em 29 de maio de 2023, após uma denúncia.
Após a denúncia, o engenheiro do MPPB foi até o local e identificou, durante uma vistoria, que o edifício tinha altura total 4,91 metros acima da altura permitida, de 12,90 metros, em um total de 17,81 metros.
Notificada, a Seplan informou que o empreendimento é um hotel com altura aprovada de 13,75 metros, mas que posteriormente teve uma permissão de ganho de um pavimento regulamentado por um decreto de 2021. Com isso, segundo o órgão, a infração seria relativa apenas ao 4º pavimento, com altura superada em 1,36 metros.
Ainda de acordo com a Seplan, o empreendimento foi aprovado conforme legislação urbanística vigente, mas “houve um erro na locação do prédio, que resultou no deslocamento do prédio para o recuo frontal”. Isso não resultou em ganho de área para o empreendimento, mas um “aumento de recuo nos fundos e a invasão do recuo frontal”, passível de regularização.
O g1 encaminhou email pedindo uma posição da construtora sobre a investigação do MPPB, mas não teve retorno até a última atualização desta notícia.
Edifício Jady Miranda
Jady Miranda é um dos quatro prédios alvos de inquéritos do MPPB
Reprodução/TV Cabo Branco
O edifício Jady Miranda está sendo construído na Avenida Cabo Branco, no bairro do Cabo Branco. O inquérito foi aberto em 13 de dezembro de 2023, após denúncia. Ele não está finalizado ainda, e, por isso, está inconclusivo se ele ficará acima do limite ou não.
O engenheiro do MPPB, durante visita, realizou cálculos a partir da área construída, e concluiu que a edificação “ultrapassará a altura máxima em ambas as metodologias utilizadas”.
A Seplan analisou os indícios de desconformidade e disse que uma vistoria foi feita em 5 de outubro de 2023, verificando que apenas uma parte estava construída, mas com divergências entre a situação aprovada e a situação existente.
Conforme o órgão, o engenheiro responsável pela obra indicou que o nível zero de referência para o térreo do edifício foi o da Rua Edvaldo Bezerra Cavalcanti Pinho, que fica por trás da Avenida Cabo Branco. Segundo a Seplan, como “o projeto não considerou a topografia do terreno”, o imóvel “encontra-se em desacordo com o projeto aprovado”, e a demanda foi encaminhada para autuação e embargo.
No caso, ainda conforme o relatório da Seplan, não é possível precisar a altura final do prédio pois ele ainda não está concluído, e isso só pode ser feito após a realização do processo de “as built”, que vai documentar a situação real do prédio após conclusão.
A prefeitura e a empresa Porto Bello Empreendimentos Imobiliários firmaram um Termo de Compromisso para liberação parcial da obra, e o MPPB recomendou o início do processo de “as built” para poder mensurar o dano ambiental oriundo da construção da edificação.
Em nota, a construtora responsável pela obra disse que o ‘as built’ já foi protocolado para todos os esclarecimentos solicitados pelos órgãos competentes. Afirmou ainda que desde o início da fiscalização acatou e cumpriu com todos os requerimentos solicitados.
Entenda a situação das construções
Na terça-feira (10), o MPPB se reuniu com a Secretaria Municipal de Planejamento (Seplan/JP), com a Procuradoria-Geral do Município de João Pessoa, com o Sindicato da Indústria da Construção Civil (Sinduscon-JP), e com representantes das construtoras, para apresentar os problemas relativos a estas quatro construções em particular e buscar viabilizar um acordo.
“Durante as investigações, restaram comprovadas que alguns prédios estão ferindo essa altura, que se chama altura do gabarito, e em relação a isso, eles estão com os ‘habite-se’ suspensos. Todo um dano ambiental foi gerado, e está sendo feita a valoração desse dano para que haja a demolição da parte excedente destes prédios”, disse a promotora Cláudia Cabral, responsável pelos inquéritos.
O que dizem as leis sobre proibição de espigões na orla da Paraíba?
Existem duas leis em vigor que limitam a altura máxima das construções na orla de João Pessoa, de forma que a construção de espigões fica proibida.
A primeira lei é a própria Constituição do Estado da Paraíba, promulgada em 1989, e que vale para todo o território paraibano.
Segundo o artigo 229 da Constituição da Paraíba, existe uma área de proteção de 500 metros a partir da “preamar de sizígia para o interior do continente”, que é a faixa de areia onde a maré mais alta atinge, na orla. A partir desta faixa, traça-se uma linha imaginária que segue até 500 metros continente adentro.
Dentro desta área, há um espaço de 150 metros de proteção total, onde nada pode ser construído. A partir daí, o crescimento é escalonado e gradativo, e consiste na faixa entre 350 metros e 500 metros de continente.
Na legislação estadual, a partir de 350 metros, são permitidas construções de “doze metros, compreendendo pilotis ou três andares”, chegando ao máximo de 35 metros de altura no trecho limite da área de proteção.
Essas regras valem para toda a orla da Paraíba. No caso de João Pessoa, ainda há uma legislação mais proibitiva.
Trata-se do Artigo 175 da Lei Orgânica do Município de João Pessoa, aprovada em 1990. Tecnicamente, esta lei não seria necessária, pois a estadual se sobressai às regras municipais, mas como ela é mais restrita, acaba se sobrepondo apenas no trecho limite dos 500 metros da área de proteção.
Em toda a capital, na faixa final, ao invés do limite máximo de 35 metros de altura, definida pela lei estadual, a altura máxima deve ser de 12,90 metros, conforme lei municipal.
Quais os crimes que os espigões irregulares podem ter cometido?
Conforme ambas as legislações, “constitui crime de responsabilidade a concessão de licença para a construção ou reforma de prédios na orla marítima em desacordo com o disposto neste artigo”.
No caso, a disciplina dessas construções fica a cargo do Plano Diretor de cada município, no caso da lei estadual.
Na lei municipal de João Pessoa há uma pequena diferença acerca destas responsabilidades.
Outras duas mudanças são mais visíveis. A alínea “c” do inciso 1º da Constituição do Estado da Paraíba é justamente aquela que trata sobre a previsão de crime de responsabilidade para a autoridade pública que permitir concessões de licenças em desacordo com a lei.
Por estar presente na Constituição do Estado, essa regra vale também para os casos registrados em João Pessoa, mas alínea “c” do inciso 1º da Lei Orgânica do Município trata dos hotéis instalados nessa faixa de proteção. Texto diz que “nos equipamentos hoteleiros, será facultativo o pavimento em pilotis, sendo que o pavimento térreo só poderá ser utilizado como áreas de componentes de serviços, ficando vedado, sob qualquer hipótese, a ocupação do mesmo por unidades habitacionais”.
A outra diferença está na alínea “d” do inciso 1º da Constituição do Estado da Paraíba, que foi incluído em 2003 pela Assembleia Legislativa da Paraíba e que não existe na legislação municipal.
Isso porque, naquele ano, definiu-se que excetua-se da lei estadual “a área do porto organizado do município de Cabedelo”, mas apenas “para as construções e instalações industriais”. A medida foi feita para autorizar a construção de um grande moinho na região portuária, dentro do perímetro protegido pela lei.
O que vai ser feito a partir de agora?
Segundo o Ministério Público da Paraíba, os inquéritos civis sobre estes prédios estão transcorrendo dentro dos princípios da ampla defesa e do contraditório, baseados em uma perícia ambiental. “Foi possível constatar que o projeto executório divergia do projeto inicial do licenciamento e que a altura da edificação estava superior ao permitido por lei, gerando assim o dano ambiental de natureza permanente e irreversível”, declarou a promotora.
Durante a reunião, foram discutidas medidas resolutivas a serem possivelmente contempladas em um Termo de Compromisso de Ajustamento de Condutas (TCAC) quanto ao limite máximo de altura dos edifícios. A posição do MPPB sobre o assunto é pela mediação, inicialmente, e pela demolição da parte excedente dos edifícios.
De acordo com o presidente do Sindicato da Indústria da Construção Civil de João Pessoa (Sinduscon-JP), Wagner Breckenfeld, o órgão se mantém em contato com o MPPB para discutir a situação. Segundo ele, existem divergências entre a legislação e normas da construção civil.
Breckenfeld ponderou que novas vistorias vão ser feitas nos empreendimentos, com o intuito de saber o excedente de construção. “Se alguém está construindo essa parte excedente, se ainda está construindo, é preciso se verificar. Mas o que eu tenho escutado dos associados, porque existem construtoras que não são associadas nossas, então não podemos falar sobre elas, eu estou sabendo, que pararam sim (as obras das construtoras associadas)”, disse.
Em entrevista à CBN Paraíba, o procurador-geral de João Pessoa, Bruno Nóbrega, falou sobre o posicionamento da prefeitura acerca do assunto.
“Ficou consignado lá na reunião que na próxima segunda-feira vai haver uma vistoria conjunta com a presença do engenheiro do Ministério Público, do engenheiro da Prefeitura e também do engenheiro das construtoras, em que haverá uma averiguação conjunta realmente da altura que foram construídos os prédios. Após essa perícia, será designada uma nova reunião com todos os que estiveram presentes na reunião anterior”, disse.
Ainda segundo o procurador, todos os alvarás de construção foram emitidos com as alturas permitidas, mas foi constatado que na construção os edifícios, houve um descumprimento com relação aos alvarás de construção. “Isso só foi constatado na hora da vistoria para a emissão da carta de ‘habite-se’, já com os prédios finalizados”, disse.
Em relação à demolição, Bruno diz ainda que há duas propostas sendo debatidas e que podem ser acordadas com as construtoras: uma seria de demolir a parte excedente, e a outra, para os casos em que seja impossível, as construtoras pagariam uma multa em formato de compensação pelo dano ambiental.
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Fonte: G1