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As fortes chuvas que devastaram boa parte do Rio Grande do Sul deixaram mais de cem mortos e afetaram gravemente a economia do estado. A destruição teve efeitos também sobre a produção de vinhos da principal região dedicada à bebida no Brasil, com estragos em plantações de uvas, na distribuição e mesmo na vida dos trabalhadores envolvidos na indústria vitivinícola.
Três meses depois, entretanto, o vinho brasileiro consegue se mostrar vivo, com boa qualidade e espalhado também por outras partes do país. Uma demonstração clara disso foi o evento Vinho na Vila, realizado no bairro de Higienópolis, em São Paulo, no início de agosto.
Cerca de 30 produtores de todo o país —mas a maior parte do Rio Grande do Sul— se reuniram para apresentar alguns dos melhores trabalhos com vinho no país. Em degustações de rótulos de alto nível e conversas com os produtores, foi possível perceber que o pior do susto para a bebida nacional já passou.
“As vinícolas do Sul sofreram, especialmente as da Serra Gaúcha. As uvas também ficaram encharcadas e podem perder sabor pelo excesso de água, mas hoje o maior impacto está no transporte, na distribuição e no enoturismo”, explicou Larissa Fin, organizadora do evento.
A maior parte dos produtores reunidos ali repetiram uma avaliação semelhante. Demetrius Guerra, da vinícola Dom Cândido, de Bento Gonçalves, explicou que a região não teve tanta destruição nas plantações. “Não tivemos perda material, só emocional, com efeito sobre funcionários”, disse. Enquanto apresentava um bom vinho branco produzido com chardonnay e cheio de mineralidade, ele disse que também há impacto no enoturismo, que responde por 30% do faturamento da vinícola.
Eloisa Domeneghini, da vinícola Garbo, explicou que outro efeito sentido pelas vinícolas do Sul do país foi nas vendas no mercado local, que ainda é onde há a maior distribuição deles.
A Garbo vinifica uvas de diferentes partes do estado e faz bebidas muito interessantes e menos tradicionais, como o Inquieto, uma mistura de merlot com sauvignon blanc, que é aromático e muito fresco. Eles chegaram a perder uma parte das suas plantações, mas dizem que já se recuperaram totalmente.
A preocupação com a recuperação da logística e do enoturismo foram centrais também em conversas com produtores das vinícolas Terraças, da Tramarin, da Casa Dorigon, da Luiz Argenta e de várias outras de diferentes partes do estado.
Para além da recuperação das vinícolas no sul, entretanto, o evento em São Paulo serviu para reforçar a ideia de que a produção de vinho está se espalhando e ganhando espaço com qualidade em todo o país.
Se antes era surpreendente haver vinhos feitos no sertão do Nordeste, com a Rio Sol, que apareceu há mais de duas décadas, o jogo mudou com a técnica de dupla poda, que permite a colheita de uvas no inverno, quando o tempo é mais seco no Sudeste e no Centro-Oeste. Agora é possível ver boa bebida saindo de lugares inusitados como Goiás, Minas Gerais, São Paulo e até mesmo a Vila Madalena, na capital paulista.
“O Brasil é um país onde todo o mundo gostaria de estar produzindo vinho. O vinho brasileiro é muito mais do que o Sul do Brasil. Ele vem de norte a sul”, disse Fin, que organiza o evento.
Ainda que possa soar um exagero dada a história recente da produção nacional, é evidente que na última década têm crescido exponencialmente as experiências vitivinícolas nacionais, com resultados cada vez mais surpreendentes.
Uma dessas agradáveis surpresas é o vinho de Goiás. A Vinícola São Patrício, de Rianópolis, começou seus primeiros testes em 2016, mas já colocou belos vinhos com o “terroir do cerrado” no mercado. “Começou como hobby, mas acabou crescendo e virando nosso negócio”, contou Carolina Martin. A vinícola hoje tem 6,5 hectares produzindo bons vinhos, especialmente com a uva syrah.
A história não é muito diferente da contada por Marcelo Luchesi, da Innvernia, de Espírito Santo do Pinhal, região paulista que tem se consolidado no cenário com várias boas vinícolas. “Começamos em 2021 e estamos experimentando com 29 castas diferentes”, contou.
Em Minas, há sete anos a Cave das Vertentes rompeu com a tradição cafeeira da região de mesmo nome e hoje faz grandes vinhos finos com sauvignon blanc e syrah. “A uva é bem mais exigente e temperamental do que o café, mas o resultado tem sido ótimo”, disse Bruno Franco, que lidera a vinícola.
Mais surpreendente é o caso da produção de vinho no miolo de São Paulo, pela Vinícola Urbana, que usa uvas plantadas no interior do estado, no Rio Grande do Sul e em Pernambuco para fermentar e amadurecer a bebida na Vila Madalena.
A qualidade do vinho brasileiro realmente começa a impressionar, e tem recebido prêmios internacionais, mas é preciso salientar que essa produção em vinícolas que se propõem “boutiques” estão longe de oferecer vinhos mais baratos do que os importados de países já consagrados pela bebida. No evento em São Paulo, era raro encontrar vinhos por menos de R$ 100, por exemplo, e os melhores chegavam mais perto de custar R$ 200 por garrafa.
“O preço dos vinhos brasileiros é alto por conta da exclusividade”, explicou Fin. “Vinícolas menores fazem poucas garrafas e têm um perfil diferente de grandes importados. São vinhos mais artesanais e exclusivos e por isso são mais caros”, explicou.
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Fonte: Folha de São Paulo