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Quando escreveu que a descoberta de um novo prato traz mais felicidade à humanidade do que a descoberta de uma nova estrela, Jean Anthelme Brillat-Savarin, um dos pais da gastronomia francesa, jamais imaginaria a gororoba que seus compatriotas inventariam no século 21.
Chega a ser difícil de acreditar que, no país mais associado à culinária refinada e cheia de regras, uma das comidas mais populares da atualidade seja uma tortilha de trigo recheada com um amontoado de carnes, molhos, legumes e batatas fritas e depois enrolada como um travesseiro e que serve para alimentar o mais faminto dos apetites.
Esses são os french tacos, assim mesmo, sempre em inglês e sempre no plural (“um tacos”).
Meio sanduíche, meio refeição completa, eles não são nada perto do que um mexicano reconheceria como um taco (além da tortilha), mas são bem franceses em sua origem, apesar de misturar influências globais.
Podem ser entendidos como uma resposta francesa ao burrito tex-mex, ao kebabe de influência turca que domina a Europa, ao x-tudo, ao dogão de Osasco e mesmo à batata de Marechal Hermes, no Rio de Janeiro. É um grande embolado de referências culturais e gastronômicas com tudo o que se pode encontrar pela frente, em um prato rico em calorias e capaz de encantar os paladares franceses, especialmente os mais jovens.
Sua origem é controversa. Sabe-se que surgiu na região de Lyon (conhecida como capital gastronômica da França), talvez em Grenoble ou em Vaulx-en-Velin, na virada do século. Trata-se de uma criação coletiva dos snacks, as lanchonetes que atendem ao público jovem e de periferia e que costumam servir kebabes, hambúrgueres, pizzas, cachorros-quentes e afins. O objetivo é ter o máximo de comida com o mínimo de custo.
A mistureba deu certo, surfou na miscigenação cultural, escapou do preconceito que alguns xenófobos ainda poderiam ter com a influência árabe e muçulmana (contra os kebabes) ou mesmo anti-imperialismo americano (“fora, McDonalds!”). E ganhou uma cara local, apesar do nome em inglês e com referência uma comida mexicana. Às vésperas das Olimpíadas de Paris, se consolida como um dos pratos mais populares e que mais se espalham por todo o país.
Em Lyon, é difícil fugir dos letreiros coloridos que anunciam a iguaria. E mesmo em uma cidade com tantas atrações refinadas, restaurantes estrelados, um mercado cheio de opções de alta gastronomia como foie gras, trufas e afins, é difícil não se render à curiosidade de experimentar o que muitos franceses comem hoje em dia.
Uma das redes mais populares e com melhor avaliação em sites na internet (sim, os franceses avaliam a qualidade das lanchonetes com cuidado) é a Le Tacos de Lyon, que se propõe “inventora” do prato, em 1999.
O sistema para fazer o pedido é todo digital, como em qualquer grande rede de fast food em shoppings no Brasil. Uma tela vertical permite que o cliente faça suas escolhas. E a ideia é que cada pessoa monte a sua própria receita.
Tudo começa com a escolha do tamanho do tacos que pretende comer. O individual já é grande, mas o personalizado pode passar de um quilo de comida.
O passo seguinte é escolher a quantidade e as carnes que se pretende incluir. Pode-se escolher até quatro na lista que inclui carne moída, carne de kebab, frango grelhado, frango empanado, frango à cordon bleu, peixe empanado, linguiça temperada, salmão, bacon e várias outras alternativas. A mistura é ao gosto do cliente.
Após uma rápida pesquisa pelas combinações mais populares, escolhemos dividir um tacos XL de três carnes com frango empanado, carne moída e bacon.
Depois escolhem-se dois molhos entre mais de 15 opções. Entre os mais populares estão o barbecue e o argelino (incluídos no nosso pedido), mas há ainda maionese, ketchup, curry e outros.
A seguir podem-se incluir extras como queijos, azeitonas, legumes, chorizo, cogumelos, mel e mais bacon (mas evitamos ir além da receita básica).
A batata frita é considerada recheio básico do tacos, então o cliente precisa pedir para retirar, se não quiser colocar ainda mais coisas dentro do “sanduíche” —mas fazer isso é considerado um desrespeito à receita oficial.
Para finalizar, o tacos é enrolado, colocado em uma grelha de sanduíche que deixa as marquinhas listradas e pode ser ainda gratinado com tomates e mais queijos (o que pareceu uma boa ideia).
O resultado é menos desagradável do que a descrição pode fazer parecer (pelo menos foi assim com a seleção escolhida para esta avaliação). Sim, é uma gororoba, pois os recheios se misturam e se tornam uma coisa homogênea em que é difícil separar os sabores individuais que formam a maçaroca.
Mas os ingredientes usados parecem de qualidade aceitável (estamos na França, afinal), e o sabor em geral é mais leve e agradável do que se poderia esperar. Isso se torna especialmente positivo quando é uma refeição para duas pessoas por € 11 (R$ 64 na França pré-olímpica, isso é pouco).
Mesmo longe de um bom taco mexicano ou de uma comida requintada francesa, não é muito diferente de outros fast foods pelo mundo. Na disputa em uma categoria que inclui um kebab de fim de noite em Berlim, com um cachorro-quente com purê em São Paulo ou com um fish and chips com vinagre de malte em Londres, essa última invenção francesa até que não faz feio.
Le Tacos de Lyon
76, rue du Bourbonnais, 69.009, Lyon, França, @letacosdelyon_officiel
10, rue Henri Chevreau, 75.020, Paris, França
19 rue Jussieu, 75.005, Paris, França
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Fonte: Folha de São Paulo