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Sabe o milho branco cozido no leite, com açúcar e canela? Qual o nome dele sua cidade? É canjica? É mungunzá?
Na boa, o nome do milho poderia ser Ricardo Afonso, e não faria a menor diferença. Quer chamar de bodrocecaturo? Opa, manda bala.
É ridículo que os nomes das comidas de quermesse tenham se tornado cavalo de batalha numa refrega regional sobre a suposta gênese dos festejos juninos no Brasil.
Quando chega esta época, um pessoalzinho exaltado começa a gritar os mesmos bordões:
“Não é canjica, é mungunzá.”
“Não é curau, é canjica.”
Deu tela azul? Se você não acompanha o embate, a coisa é realmente um pouco confusa.
Mungunzá é o nome que os nordestinos dão àquilo que no Sudeste se conhece por canjica. E canjica é como se chama o curau meridional na porção norte-oriental do país.
O problema está em achar que só um dos nomes é certo.
Há a percepção, num certo estrato da juventude nordestina, de que o São João é um patrimônio cultural deles, só deles, e foi sequestrado pela cultura de massa gerada no Sudeste.
Não. Sudeste é genérico demais, sejamos mais específicos: São Paulo.
Na posição de paulistano com alguma noção, entendo e relevo a antipatia que o resto do Brasil tem por nós. É a coisa do opressor contra o oprimido, a máquina pasteurizadora de culturas alheias etc. etc. etc.
Só que o caso do São João diz menos sobre São Paulo e o Nordeste do que sobre uma estreiteza de pensamento que grassa em qualquer lugar do mundo.
É humilhante se escorar na idade avançada, mas não tem outro jeito. Portanto, jovem nordestino, ouça a palavra deste velho. Ou eu vou te processar por etarismo, seu fedelho insolente.
Existia um mundo antes de você existir.
Nesse mundo, olha que doido, não havia internet. Tinha TV Globo a pregar o evangelho do Flamengo e difundir uma imagem caricatural do Nordeste para o país todo, com suas novelas.
De resto, a gente não acompanhava em tempo real o que acontecia longe de casa.
Por aqui, fazia frio em junho. Tínhamos as festas juninas, alternativamente chamadas de festas caipiras. Era coisa do nosso interior.
Tocava música de sanfona, mas nada parecido com forró. Dê um Google em “Mario Zan” para saber de que se trata.
Lá no fim dos anos 1980, o Carnaval da Bahia se tornou um negócio gigantesco. As empresas patrocinadoras –em geral, grandes cervejarias– enxergaram uma oportunidade de faturar horrores com a alegria das festas do Nordeste.
Foi quando começaram a injetar grana e nacionalizar o São João de Caruaru e de Campina Grande. Antes disso, o Sudeste mal sabia da existência dessas festas.
Desde então, a estética nordestina vem se mesclando à tradição caipira –e, convenhamos, ambos foram importados de Portugal– nas festas de junho.
Por isso, jovem, temos um caso de colonização pelos colonizados –assim como os brasucas estão recolonizando os tugas lá n’além-mar.
E tá tudo bem. Só não vem com papinho de apropriação cultural, por misericórdia. Deixa o curau no canto dele.
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Fonte: Folha de São Paulo