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Um acervo com cerca de 15 mil itens —entre obras de arte, artefatos e registros da cultura popular brasileira— está trancado no Pavilhão das Culturas Brasileiras, projetado por Oscar Niemeyer, no parque Ibirapuera, em São Paulo, sem previsão de abertura ao público.
A situação se estende há dez anos, devido a atrasos nas obras de restauro do prédio, que é tombado, e às mudanças causadas pela concessão da gestão do parque à iniciativa privada.
A coleção tem relíquias, como registros da missão de pesquisas folclóricas do modernista Mário de Andrade pelo interior do Brasil há 85 anos e obras de artistas dito populares muito valorizadas pelo mercado, como pinturas de Amadeo Lorenzato e esculturas de Antônio Poteiro. Há ainda artefatos indígenas, com peças dos povos karajá e tukano, que ganharam status no circuito artístico nos últimos anos.
Os itens compõem o acervo do antigo Museu do Folclore —desalojado da Oca desde 2000, quando o prédio foi cedido para exposição dos 500 anos do descobrimento— e contemplam também novas aquisições da gestão de Carlos Augusto Calil na Secretaria Municipal de Cultura.
Uma consulta a documentos públicos e profissionais envolvidos na elaboração do projeto museográfico para este acervo mostra que o museu não saiu do papel devido à falta de investimentos da administração municipal nos anos anteriores à privatização da gestão do Ibirapuera.
Agora, com a gestão do parque cedida para a concessionária Urbia, o museu deve finalmente se materializar, mas com um terço do tamanho previsto no projeto original. Na prática, o que seria um pavilhão inteiro dedicado à diversidade dos povos brasileiros não ocupará nem sequer um andar dos três pavimentos do edifício de Niemeyer.
Isso porque, na concessão da gestão do parque à Urbia, a prefeitura ficou com 4.000 metros quadrados do pavilhão, enquanto a concessionária ficou com os 7.000 metros quadrados restantes.
Marcos Cartum, diretor do órgão da prefeitura que administra o acervo, afirma ter se posicionado contra a divisão do pavilhão. “Isso restringe muito a área do museu”, diz, acrescentando que o projeto passou a se chamar Museu das Culturas Brasileiras, e não mais Pavilhão das Culturas Brasileiras.
Mas Cartum faz uma ressalva. “O museu pode funcionar nos 4.000 metros quadrados. Não é o ideal, mas pode.”
Outros profissionais envolvidos na concepção do museu, no final dos anos 2000, também dizem se preocupar. Adélia Borges, uma das responsáveis pelo projeto que norteia a instituição, afirma que o espaço expositivo deveria ser de ao menos um andar inteiro, caso contrário só haverá espaço para a reserva técnica.
Pedro Mendes da Rocha, arquiteto que fez o projeto expográfico original do museu, diz que “o pavilhão é parte do acervo, é cultura brasileira”. “Tem uma arquitetura de alto nível, com o nosso maior expoente, Oscar Niemeyer, que está lá no meio do parque”, afirma, sobre a localização privilegiada do pavilhão, em frente ao Museu Afro Brasil.
A gestora do parque diz que precisa dos 7.000 metros quadrados a que tem direito para “dar resultado para os acionistas”. Segundo Samuel Lloyd, diretor comercial da Urbia, a empresa pretende usar o pavilhão para eventos e não deve atender aos apelos para ampliar o espaço expositivo do museu. No ano passado, por exemplo, o festival de música C6 Fest já fez uma festa no pavilhão.
Lloyd diz não ver problemas na realização de festas a poucos metros de um importante acervo de arte. “De forma alguma. Qual impacto você veria?”, ele questiona. “A gente pode ter eventos de música, palestras com sonorização, com auditório e som.”
Os eventos, afirma Lloyd, não serão realizados no primeiro pavimento, onde o museu deverá funcionar, e sim no térreo ou no piso inferior. “Nossa preocupação é manter a harmonia com o museu.”
Festas do tipo também acontecem em outros museus no Ibirapuera. A Bienal de São Paulo costuma fazer um grande coquetel a cada dois anos, quando abre sua exposição principal, e o Museu de Arte Moderna promove jantares, com ou sem festa, em ocasiões pontuais. Nem a Bienal nem o MAM entraram na concessão do parque, e portanto não são geridos pela Urbia.
De acordo com o diretor da Urbia, o dinheiro a ser arrecadado com a exploração comercial do Pavilhão das Culturas Brasileiras servirá para cobrir parcialmente o investimento de R$ 70 milhões que a empresa teve de fazer ao ganhar a concessão do Ibirapuera, o principal parque da capital paulista, e de outros parques secundários.
Neste ano, o terceiro de administração privada, o Ibirapuera teve lucro de R$ 30 milhões.
A Urbia diz ainda que cogitou implantar um restaurante de comida brasileira no pavilhão, mas desistiu após conversas com a prefeitura, que apontou o perigo de instalar fogões próximos a um acervo de arte.
Lloyd afirma também que uma eventual ampliação do espaço expositivo do museu significaria redefinir as metragens determinadas em contrato, e neste caso o acordo com a prefeitura precisaria ser refeito.
O diretor da Urbia diz reconhecer a relevância da coleção de arte e argumenta que o museu será um atrativo fundamental para trazer mais público para o parque —muitas pessoas, ele afirma, nem sabem que o Pavilhão das Culturas Brasileiras existe.
Em 2015, um contrato firmado entre a prefeitura paulistana e o Banco Nacional do Desenvolvimento Econômico e Social, o BNDES, afirmava que o museu deveria ser inaugurado até 2019. Para isso, o BNDES investiria R$ 12 milhões nas obras, e o município deveria fornecer o restante do dinheiro, até um teto de cerca de R$ 24 milhões.
Contudo, o BNDES investiu pouco menos da metade do valor, e a prefeitura diz que não fez nenhum aporte. Ainda segundo a administração municipal, “o acordo com o BNDES foi formulado e descartado em outra gestão”, e as obras agora são de responsabilidade da Urbia, assim como o projeto expositivo do museu.
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Fonte: Uol