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Gostaria de dar um vinho de presente para minha mãe neste domingo, mas há alguns anos, não muitos, ela esqueceu que gosta de vinhos. Minha mãe foi diagnosticada com alzheimer há uns nove anos mais ou menos. A memória gustativa, no entanto, foi uma das que mais perdurou. Até hoje ainda há um resquício das antigas preferências. Ela ainda gosta de salame, por exemplo. De vinho, se esqueceu.
Mães também gostam de vinhos. As pessoas, às vezes, se esquecem disso. Pelo menos, essa é a impressão que tenho. Ouço as pessoas dizerem que deram esse ou aquele vinho para o pai, mas não lembro de ouvir muita gente dizer que dá vinho de presente para mãe. Eu dava.
Mulheres gostam de vinho. Entre os compradores, somos maioria. E não há essa besteira chamada vinho feminino. Mulheres gostam de vinhos leves e vinhos pesados. De doces ou secos. Tintos ou brancos, rosés, espumantes e até laranjas. Cada mulher é única. Algumas fazem questão de vinhos caros. Outras se contentam com algo gostoso e de bom preço. De uma coisa, contudo, tenha certeza: toda mãe espera que você preste atenção nos gostos dela. Nada deixa uma mãe mais furiosa do que receber de presente algo que, já disse mil vezes, não gosta. Então, se neste domingo pretende levar um vinho para sua mãe ou, especialmente, para a mãe dos seus filhos, tente lembrar o que ela costuma beber.
Minha mãe não entendia nada de vinhos. Contudo, talvez por influência do meu pai, que também não entendia muito, mas era leitor do Saul Galvão e outros colunistas, sempre bebeu vinhos bem razoáveis. Nada caro, mas coisas que eu, ainda depois de começar a trabalhar na área, bebia com prazer. Eles bebiam pouco, uma taça ou duas cada um. Lembro que ambos adoravam o bobó de camarão da chef Mara Salles, do restaurante Tordesilhas, e sempre pediam um sauvignon blanc para acompanhar. Meia garrafa para nós três. Nos últimos anos de vida do meu pai, fui algumas vezes sozinha com os dois durante a semana para comer esse bobó. Não lembro a marca do sauvignon blanc. Lembro apenas que era chileno.
Lembro bem das preferências de meu pai por este ou aquele vinho desde a minha infância, mesmo porque ele sempre me deixou provar, mas só comecei a reparar nas preferências da minha mãe quando ela já estava velhinha. Uma vez levei um vinho madeira chamado Ferraz para o meu pai (cujo sobrenome do meio era esse) e percebi que minha mãe amou. Ela falou mil vezes como aquele vinho era gostoso, como cheirava bem. No seu aniversário seguinte, levei uma garrafa desse mesmo madeira. Ela adorou. Guardou no armário da sala e foi tomando aos pouquinhos. Madeira não estraga, à diferença dos vinhos do Porto ruby, dá para fazer isso.
Dona Ana gostava muito também de malbec argentino. Lembro dela, no estágio inicial da doença, pouco depois de meu pai morrer, quando nós duas saíamos muito sozinhas para almoçar, pegando uma taça de Catena Malbec, cheirando e me passando para cheirar. “Sente que delícia!”. Gostava de vinhos com passagem por madeira. Então, se não vou dar um vinho para ela neste dia das mães, que fique registrado, pelo menos sei do que ela gostava. Prestei atenção, talvez um pouco tarde, mas prestei.
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Fonte: Folha de São Paulo