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Sentado em seu trono, em vias de devorar mais um dos próprios filhos e partir para a happy hour, Cronos –o senhor do tempo, não o modelo de pulso– está de saco cheio. Exausto de todas as suas funções, mas principalmente do alarme que apita, indicando todos os remédios para pressão do mundo.
“São muitos os destinos humanos a regular e atormentar! Boralá, minha gente, que eu tenho hora…” Então desiste e passa o trabalho à estagiária. Sua voz trovejando pelo Monte Ótris. “Alexa, que horas são?”
“São 23:57, tenha uma boa noite.” Responde a bolota que habita minha mesa de trabalho, enquanto leio em voz alta este meu delírio. Eficientíssima, desde que haja wifi. Geringonça ideal para uma pessoa como eu, que não usa relógio.
Por alergia a pulseiras de couro ou borracha, sim, mas por convicção também. Concordo com Cortázar sobre sermos nós os presenteados a ele, não o contrário. Além do que, celular é o novo carrilhão de bolso. Uma solução para anacronismos.
Contudo, graças a um amigo, fui apresentada à alta relojoaria. Onde o que menos importa é a hora. A graça está nas complicações, um conjunto de características que transforma certos relógios em portentos do engenho humano.
A terminologia desse métier, por si só, é fascinante. Existem horas saltantes, alternâncias, reservas de marcha, esqueletos e até turbilhões, um mecanismo que compensa a força da gravidade e as irregularidades do movimento do corpo.
Badalado como convém a um artefato dessa natureza, o recordista absoluto de complicações é suíço e possui 57. Entre elas, calendários gregoriano, judaico e lunar. Indicações de solstício, equinócio e signos do zodíaco. Alarmes com petite ou grande sonnerie, que nem sei o que são, mas soaram bonito.
Agora, veja você: meu amigo entusiasta de relógios é justamente a pessoa com os ponteiros mais confusos do juízo. O que me leva a pensar num povo complicado demais que bate ponto por aí. Você é desses?
Faz-se um convite com antecedência, hmmm, precisa checar a agenda. Na véspera, ah, está muito em cima. Meia hora para escolher um filme. Onde jantar? Mais fácil pedir uma pizza. De que sabor? Ihhh, liga o cronômetro e espera sentado.
Uma vez, porém, que a palavra “crônica” também deriva de “cronos”, sinto-me no lugar ideal de fala. “Alexa, que horas são?” Tempo de mudar. Relógios suíços podem ser assim, mas talvez você –com suas complicações– seja apenas chato.
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Fonte: Uol