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O cubo branco, modelo modernista de arquitetura para abrigar exposições de arte, foi banhado de vermelho pela artista Lia Chaia. Os diferentes tons de rubro servem para ambientar a obra em vídeo disposta no meio da sala, que mostra um corpo feminino nu.
Sobre o corpo, um desenho animado parece representar as entranhas da personagem sem rosto, que estão agitadas e se mexem sem parar. “Estão remoendo algo”, afirma a artista. Poderia ser aflitivo, mas os traços desenhados à mão livre por Chaia lembram recortes de mandalas, quase como se tivessem a obrigação de apaziguar qualquer angústia.
Os desenhos também ocupam uma parede inteira do segundo andar da galeria Vermelho, em São Paulo, onde a artista abre a exposição “Organoide”. Chaia fez parte de um grupo de artistas que criticavam os modelos de urbanização no Brasil moderno que pregavam a lógica desenvolvimentista que prometeu ao país uma grandiosidade nunca entregue.
Conhecida por obras que investigam a inserção do ser humano em paisagens urbanas e naturais, Chaia agora se volta para o interior do corpo.
Tanto pelas formas quanto pelas cores, suas figuras lembram intestinos, estômagos, corações e úteros. “Passei um tempão estudando as cores de todos os nossos órgãos”, diz.
Mas os padrões dos desenhos expostos sugiram espontaneamente, segundo ela. “É totalmente livre. Tem a ver com movimento, com cor, com gesto. Acho que vem um pouco da minha experiencia com palhaço, de improviso. Não tem um projeto. É fluido, eu vou fazendo”, afirma.
Em certo momento, as formas saíram da parede para se tornarem objetos 3D. “Organóides” são uma série de esculturas feitas em finas placas de madeira, pintadas com tinta em variações de vermelho, laranja, amarelo e violeta. “Organóide é termo científico. Os cientistas criam essas células para fazer pesquisas, para criar remédios”, diz.
As mesmas cores são usadas para outra série de mobiles, “Como Vai? Como Vai? Como Vai?”, em que pares de mãos penduradas no teto se movem de acordo com o vento. Às vezes se cumprimentam, outras se desencontram.
O trabalho foi pensado durante a pandemia de Covid, quando a pergunta comum em cumprimentos não podia mais ser feita com leveza. A catástrofe sanitária não permitia que ninguém estivesse bem.
Todas as obras expostas foram criadas por Chaia de 2020 a 2024. A última delas é uma série de aquarelas de proporções enormes. Observadas de longe, parecem cobras em vários tons de verde, que se encontram e desencontram e, às vezes, se entrelaçam, misturando tons.
Quem se aproxima, porém, nota que as figuras não são cobras, mas colunas vertebrais. Chaia fez moldes para cada uma das vértebras que compõem a estrutura responsável por todos os movimentos do corpo. Depois, pintou uma a uma, a cada nova coluna que ocupava o papel branco.
“É como se estivessem dançando. Quando usei a aquarela, uma tinta aguada, lembrei do liquido que passa pela coluna”, diz, ao se referir ao liquido cefalorraquiano, ou líquor. A cada pintura, as colunas-bichos parecem se encontrar mais e mais, até que as vértebras começam a se separar e a ocupar o espaço do papel sem mais respeitar as regras anatômicas —quase como se tivessem morfado, e agora fossem
ossos de animais fantásticos.
O corpo sempre foi central em sua produção. Ela lembra quando, em um de seus primeiros trabalhos, desenhou no próprio corpo com uma caneta vermelha, até que a tinta acabasse. “Eu posso explicar, mas acho mais fácil que a obra fale por si só”, afirma.
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Fonte: Uol