[ad_1]
Nunca tinha visto tanta gente sorridente em Londres. Banksy, o desconhecido mais famoso do mundo, decidiu que a parede do prédio onde moro era o cenário perfeito para o seu mais recente mural, uma obra que pode valer milhões de dólares.
Desde que a pintura apareceu no domingo, 17, as pessoas se aglomeraram em volta da minha janela sorrindo e olhando para mim com cara de: “Posso entrar no jardim e tirar uma foto?”
Presumo então que o Banksy é meu, e digo a elas que sim, tirem todas as fotos que quiserem.
Acostumado a vê-los bastante sérios no metrô, evitando contato visual no elevador ou com a cabeça coberta nos dias de chuva, de repente estou cercado por um bando de desconhecidos me bombardeando com perguntas.
“Você viu o Banksy? Qual é a sensação de ter seu próprio Banksy? O que a obra significa? Te incomoda o fato de estarmos aqui? Vão aumentar o preço do seu aluguel?”
Alguns são mais ousados e vão direto ao ponto: “Você é Banksy?”. Não digo que sim, mas tampouco digo que não.
Outros, em um gesto que é um misto de pudor e amabilidade, dão dinheiro aos filhos pequenos, que vêm correndo até minha janela para me oferecer uma gratificação por proporcionar a eles uma bela lembrança.
Nesse momento, penso em quanto eu pago de aluguel, e que o valor pode disparar com esta obra do Banksy. Mas, depois de um breve momento, me encho de dignidade e digo a eles que não, obrigada, é melhor usarem o dinheiro para comprar doces no mercado ao lado.
Alguém, claramente com um faro melhor para os negócios do que eu, sugeriu que eu colocasse o apartamento no AirBnB: “Lindo apartamento decorado com um Banksy original”, uma espécie de BanksyBnB.
Uma cerejeira que dá maçãs
Não, eu não vi o Banksy. Nem sequer estava em casa quando ele pintou o mural.
Tudo indica que aconteceu na madrugada de domingo, então meu consolo é que, mesmo que eu estivesse lá, provavelmente foi tudo tão rápido que eu nem teria notado.
Cheguei depois de meio-dia, e já tinha gente tirando foto, fazendo vídeo e, claro, especulando sobre a obra.
Vários notaram que o mural coincidiu com o Dia de São Patrício, ou St. Patrick’s Day, 17 de março, uma celebração em que a cor verde prevalece.
Além disso, ele escolheu a mesma cor verde usada nas placas das moradias sociais em Islington, o bairro no norte de Londres onde está o mural.
Na segunda-feira, o artista publicou algumas fotos em seu Instagram confirmando que ele é o autor da obra —mas fora isso, o resto são apenas teorias e especulações.
Parece que Banksy, seja lá o que isso signifique, usou um extintor de incêndio para disparar a tinta na parede rachada.
A árvore verdadeira é uma cerejeira e está bastante doente, parece morta, por isso há quem diga que Banksy reviveu a folhagem com a pintura.
E a menina, ou menino, segurando uma mangueira semelhante às usadas para fumigação. Seria uma mensagem sobre a natureza?
A obra segue viva, algumas pessoas chegam com maçãs, e colocam ao redor do tronco, como se tivessem caído dos galhos. Foi assim que Banksy criou a única cerejeira que dá maçãs.
Se juntarmos as pistas sobre a obra e as formas como as pessoas interagem com ela, as interpretações são infinitas, como acontece com todas as intervenções do artista.
Quando acordei na quarta-feira, 20, vi que alguém tinha jogado tinta branca no mural. Seria vandalismo?
15 minutos de fama
Agora minha casa é uma atração turística. Enquanto escrevo este artigo, faço algumas pausas, e as pessoas me passam seus celulares para que eu tire fotos delas.
Em menos de uma hora, dei entrevistas para a imprensa local, japonesa, alemã e para estudantes que em breve serão colegas de profissão.
Um garoto australiano me deu de presente uma foto instantânea, mandei um “oi” para os seguidores de uma mexicana que estava transmitindo ao vivo no TikTok, e uma colombiana, como eu, me disse que, se estivesse no meu lugar, já estaria vendendo arepas e cerveja.
Uma norueguesa, que ficaria apenas 8 horas em Londres, decidiu que sua prioridade era vir ver o mural.
Isso é arte
Sou de Cartagena, no Caribe colombiano. Lá, por causa do calor, é normal deixarmos as janelas sempre abertas e levarmos cadeiras de balanço até à porta da rua “para apanhar ar fresco” e conversar com as pessoas que passam.
Aqui em Londres, isso não acontece, então estou me sentindo à vontade nesses dias.
Ontem, depois de seis meses morando neste apartamento, graças ao mural conversei pela primeira vez com meu vizinho, um somali que agora está preocupado com sua privacidade diante de tanta gente ao redor.
E assim tenho passado os dias, conhecendo pessoas de vários países, recebendo felicitações como se tivesse algum mérito nisso tudo, acenando como uma miss e explicando minha opinião sobre o mural: “Não sou especialista, mas acredito que…”.
Estou feliz, não sei se ainda estarei feliz no fim de semana, quando uma horda de turistas decidir que depois de ver o Big Ben e o Palácio de Buckingham, a próxima parada será meu apartamento.
Este mural surgiu logo no fim do inverno, quando a cidade começa a se encher de cor, e o humor de todo mundo melhora.
Então, para mim, este foi o melhor começo de primavera. Graças a um gênio enigmático, a uma árvore moribunda e uma parede em ruínas, me cerquei de gente bacana, e senti que mesmo sendo imigrante, faço realmente parte desta comunidade.
Isso é arte, eu suponho.
[ad_2]
Fonte: Uol