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O governo já não consegue mais esconder sua briga interna para definir como encontrar recursos do Orçamento da União necessários ao financiamento de seus planos na segunda metade do mandato do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). Diante de despesas correntes fora de controle e uma arrecadação insuficiente, o Planalto enfrenta ainda uma batalha com o Congresso pelo controle das verbas remanescentes das emendas parlamentares, sob pressão adicional de um conjunto de despesas obrigatórias que absorvem 92% de toda a execução orçamentária.
Esse desconforto dentro do governo se mostrou também na reunião ministerial convocada por Lula nesta segunda-feira (13). “Não é cada um dá sua ideia”, reclamou ele. As limitações de caixa ficaram evidentes também quando emendas parlamentares se tornaram o primeiro instrumento para o socorro financeiro do Rio Grande do Sul, arrasado pelas enchentes.
Economistas, tanto de dentro quanto de fora do Executivo, apontam que o caixa da União já está exaurido. Essa situação levou o governo a envolver o Judiciário na sua busca por dinheiro do Orçamento. A pedido da Advocacia-Geral da União (AGU), o Supremo Tribunal Federal (STF) barrou a continuidade da desoneração da folha salarial de 17 setores econômicos, medida amplamente aprovada por deputados e senadores. O risco iminente é que novas ações judiciais contra os chamados “abusos orçamentários” do Congresso se tornem uma rotina.
Os sinais de tensão crescente em torno dos dilemas fiscais, que tendem a se intensificar nos próximos dois anos, são evidentes, a menos que a gestão petista adote medidas extraordinárias para conter os gastos e reavaliar seus programas.
Nesse ambiente de estresse, emerge o debate sobre a necessidade de desvincular receitas de despesas com percentuais previamente definidos, como é o caso dos gastos da União com educação e saúde – apesar das fortes resistências do PT, de outros partidos de esquerda e até mesmo do próprio Lula.
Tebet vê risco fiscal nas despesas obrigatórias
A ministra do Planejamento, Simone Tebet (MDB), tem sido nos últimos dias a porta-voz das preocupações na Esplanada com a crise fiscal, propondo um amplo pacote de cortes de despesas. Antes disso, ela havia sugerido a desvinculação entre os reajustes anuais do salário-mínimo e os benefícios previdenciários e sociais, além de propor a revisão dos desembolsos mínimos em saúde e educação, os quais são atualizados pelo crescimento da receita.
No entanto, o tempo para a tomada de decisões políticas acerca de medidas de ajuste está se esgotando, como frisou Simone Tebet em entrevista ao jornal O Estado de S. Paulo, no sábado (11).
Após enfrentar duras críticas da presidente do PT, a deputada Gleisi Hoffmann (PR), que rotulou suas sugestões como “ideias ruins”, Tebet também foi confrontada pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad, ao responder que há “pouco espaço” no governo para debater tais temas.
Apesar disso, a ministra do Planejamento persiste em seus alertas ao Planalto. “A partir de 2026, os recursos para despesas discricionárias (não obrigatórias), exceto emendas parlamentares, começarão a se tornar escassos, atingindo limite insustentável”, disse.
Chama a atenção o fato de Haddad ter até recomendado publicamente a leitura de um artigo do economista Bráulio Borges, da Fundação Getulio Vargas (FGV), que defende medidas de aumento de arrecadação, base da estratégia governista, mas também propõe desvincular o salário-mínimo da Previdência e alterar os pisos da educação e da saúde.
Dívida e juros crescem e Lula desdenha da crise
Enquanto isso, apesar dos limites impostos pelo novo arcabouço fiscal aprovado em 2023, a dívida pública continua crescendo de forma acelerada, os juros futuros cobrados pelos agentes financeiros são revisados para cima e o governo vê suas poucas chances de manobra se esvaindo dia após dia.
Ao celebrar cada bilhão de reais que consegue retirar das mãos dos congressistas, a um custo político cada vez mais alto, o governo está dividido sobre como recompor seu caixa em 2025 e 2026.
Aprovado no ano anterior com o objetivo de equilibrar as contas públicas na expectativa de aumentos da receita, o novo marco fiscal já teve seus alvos revistos devido à frustração de parte do plano de aumento de arrecadação de Haddad e ao forte aumento das despesas. Haddad já destacou que a continuidade desse arranjo é uma “decisão política”, em consonância com sua colega na área econômica do governo.
É improvável que Lula siga o caminho da austeridade, ajustando as contas pelo lado do corte das despesas. As cobranças por responsabilidade com as contas públicas irritam Lula, que faz questão de lembrar que a relação entre dívida e Produto Interno Bruto (PIB) é superior a 100% em países desenvolvidos como Estados Unidos, Japão e Itália.
“Fico irritado quando vejo muita notícia de déficit fiscal. É uma discussão inócua”, disse ele em entrevista recente, ignorando fatores como valor da moeda nacional e taxa de juros doméstica.
Reforma da Previdência voltou ao debate público
Com essa indiferença para a crise fiscal, o chefe do Executivo agrava seu próprio problema. Não por acaso, começam a circular projeções de mudanças nas regras previdenciárias. Após quase cinco anos da Reforma da Previdência (2019), gastos com aposentadorias, pensões e outros benefícios no setor privado devem ultrapassar R$ 900 bilhões este ano e podem chegar a R$ 1 trilhão em 2025.
Segundo relatório do Banco Central (BC), a dívida bruta do setor público cresceu R$ 268 bilhões em três meses, totalizando mais de R$ 1,1 trilhão desde o início do terceiro mandato de Lula. No fim de 2022, o Brasil devia R$ 7,22 trilhões, o equivalente a 71,7% do PIB. Em março de 2024, o montante alcançou R$ 8,347 trilhões ou 75,7% do PIB.
Das 44 empresas estatais sob controle direto da União, como a EBC, a Embrapa e a Codevasf, 17 dependem de recursos do Tesouro para manter as operações. O governo estima destinar R$ 27 bilhões para as companhias dependentes em 2024.
Também está previsto um déficit nas contas do Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT) a partir de 2025, o que acendeu alertas diante do risco de o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) precisar devolver ao fundo recursos usados para impulsionar investimentos.
Presidente do BC aponta carga tributária no limite
Em recentes entrevistas, o presidente do Banco Central (BC), Roberto Campos Neto, afirmou que o Brasil corre o risco de “perder” sua âncora fiscal, tornando o trabalho da autoridade monetária mais difícil e oneroso.
Sem credibilidade na política fiscal, a expectativa inflacionária se deteriora, afetando a curva de juros no longo prazo. Ele acrescentou que os observadores internacionais lamentam pela percepção de uma interrupção na agenda de reformas voltada à contenção do crescimento da dívida pública, iniciada no governo do ex-presidente Michel Temer (MDB).
Campos Neto também defende o fim da ampla indexação do Orçamento, visando a administração flexível e eficiente dos gastos públicos. Diante da conjuntura atual, o presidente do BC expressa preocupação quanto à combinação de crescimento estrutural baixo, impulso na trajetória da dívida pública, carga tributária elevada e divergências sobre a qualidade do gasto. O receio é de que isso possa minar ainda mais a confiança dos investidores no país.
Ele destaca especialmente a iminência da política fiscal atingir o ponto crítico da Curva de Laffer, conceito que aponta o limite onde aumentos de tributação não geram arrecadação extra, podendo até reduzi-la devido ao desestímulo à atividade econômica.
Segundo o analista financeiro Vandyck Silveira, é inegável que o governo está prestes a travar um duelo por recursos junto aos parlamentares, possivelmente recorrendo à judicialização. Ele argumenta que, dada a atual escassez de recursos no Orçamento, seria necessário promover cortes de gastos substanciais. Mas essa agenda não está nos planos do governo.
“Observa-se que, devido à falta de credibilidade na política fiscal, os juros já indicaram que haverá consequências a serem enfrentadas”, disse.
Silveira enfatiza a necessidade urgente de desindexar o Orçamento para viabilizar uma política fiscal eficaz. Ele destaca que a correção automática do salário-mínimo é um elemento que impulsiona as despesas federais para um nível insustentável.
“Se a frouxidão fiscal persistir, o Brasil corre o risco de enfrentar crise econômica severa nos próximos 10 anos, o que exigirá ajuste mais drástico”.
STF já tem precedente contra “abuso legislativo”
Na perspectiva de uma eventual judicialização buscada pelo Planalto contra “abusos orçamentários” do Congresso, já há pelo menos um precedente favorável em sua direção.
Os ministros do STF decidiram acatar o pedido da governadora de Pernambuco, Raquel Lyra (PSDB), para suspender trechos da lei orçamentária do estado que ampliavam os poderes do Legislativo estadual sobre os recursos do Executivo.
O caso, relatado pelo ministro André Mendonça, que já havia concedido liminar favorável à governadora, envolveu medidas de controle orçamentário pela Assembleia pernambucana que, na prática, limitariam a gestão estadual. Embora a governadora tenha vetado os trechos, o Legislativo derrubou os vetos, levando Raquel a recorrer ao STF.
A Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) de Pernambuco previa repasses automáticos do excesso de arrecadação do Executivo ao Legislativo e Judiciário, além de obrigar o governo a transferir até junho todos os valores das emendas parlamentares previstos para o ano, o que deixaria o Executivo estadual sem caixa para operar. Os deputados também pretendiam que o Executivo fosse obrigado a atualizar o orçamento sempre que o Legislativo aprovasse projetos que gerassem “renúncia de receita ou aumento de despesas”.
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Fonte: Notícias ao Minuto