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Acordei nesta terça-feira (7) com a seguinte notícia na caixa de e-mail: “Monte Belo do Sul comunica adiamento do 12º Polentaço”.
A razão do adiamento, como se lê nas primeiras palavras da mensagem, é o armagedon climático no Rio Grande do Sul. Parte do território de Monte Belo do Sul compõe o chamado Vale dos Vinhedos –o restante está nos municípios de Bento Gonçalves e Garibaldi.
Preciso confessar que a primeira reação foi achar a notícia incomodamente engraçada. Polentaço? Que coisa surreal.
Contribui para tal percepção a foto que reproduzo neste post: um grupo de homens de boné despejando centenas de litros de polenta mole, de um tacho gigante para um tabuleiro gigante.
Em seguida, veio outro tipo de incômodo. Adiamento do polentaço? Grande coisa. Os mortos vão às centenas, uma multidão desabrigada, Porto Alegre inteira em colapso. Querem que eu fale de Polentaço?
Fechei o e-mail, mas o Polentaço ficou fermentando na minha cabeça.
Finalmente, no meio da tarde, caiu a ficha: polentaço não é pouca coisa, é o tempero da vida. O Polentaço merece respeito, a minha atenção e a divulgação na mídia de alcance nacional. Sou, de certa forma, um jornalista de polentaços.
Cada um faz o polentaço a seu modo. O polentaço de alguns é a programação da Osesp. O polentaço de outros é o baile funk. Mas, sem polentaço, viver é duro demais.
Então falemos do Polentaço.
Começo explicando o que é o Polentaço de Monte Alegre do Sul, caso não tenha ficado suficientemente claro.
Aquela região da Serra Gaúcha foi povoada por colonos italianos, mais especificamente das regiões do Vêneto, Trento e Friuli, ao nordeste da península.
Os “gringos”, como são chamados os descendentes desses imigrantes, são ainda fortemente arraigados à terra e à atividade agrícola. Não há muitas opções de entretenimento nas zona rurais da serra.
As festas agrícolas são um acontecimento para essas pessoas. E o Polentaço se insere na Festa do Agricultor de Monte Alegre do Sul. Polenta porque representa a comida simplória que os camponeses pobres trouxeram da Itália, polentaço porque agora dá para se esbaldar de tanto comer polenta.
Neste ano, deveria ocorrer entre 17 e 19 de maio. Foi adiado sem previsão de retomada. Compreensível demais.
Tente se colocar no lugar de um morador “x” de Monte Alegre do Sul.
Sua rotina é acordar cedo e dormir cedo. Preocupar-se com as parcelas do financiamento do trator e da caminhonete. Cuidar do milharal, dos porcos e dos patos. Consertar o que quebra ocasionalmente.
Mas tem o Polentaço.
Não, não tem mais.
Você não tem mais onde dormir, portanto não acorda. Trator e caminhonete, que não estavam pagos, foram levados na enxurrada e o seguro não cobre. Plantação e animais, tudo morto. Tudo irremediavelmente quebrado, destroçado, perdido.
Isso com a presunção de que todos na família estão vivos e bem. Nem sempre o cenário possível.
Sobrou-lhe apenas a parte trágica da vida, multiplicada por mil.
Nada para levar a cabeça para longe do lodaçal do desespero. Nada de Polentaço.
Volta logo, Polentaço, precisamos de você!
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Fonte: Folha de São Paulo