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Não há outro assunto possível nesta semana no Brasil senão a tragédia enfrentada pelo Rio Grande do Sul. Antes, a ideia era indicar nesta coluna vinhos para o seu Dia das Mães, contar a história de duas empreendedoras brasileiras que em seis anos montaram uma marca de sucesso premiada lá fora enquanto criam seus filhos pequenos, mas as chuvas que atingem o maior produtor de vinho do país, as mais intensas registradas ali em décadas e que causaram deslizamentos, romperam barragens e deixaram mortos e desaparecidos, apontam para outra direção, a da crise climática.
A cada novo desastre ambiental ela mostra sua presença mais visivelmente para os que ainda não sentem seus efeitos na pele. Para quem cuida da terra e depende dela, como vitivinicultores dos quatro cantos do planeta com quem já conversei, é uma realidade evidente. Os produtores mais atentos e precavidos entenderam há anos que, diante desse cenário, precisam estudar e agir para manter a qualidade de seu produto e a sobrevivência do seu negócio. Com isso, têm incorporado novas variedades de uvas e o mapa do vinho tem se expandido para áreas antes inimagináveis.
A mudança do clima fez, por exemplo, com que um país como a Inglaterra, histórica amante do vinho mas incapaz de fazê-los, virasse produtora de espumantes. Já a tradicional região francesa de Bordeaux, onde estão os grandes châteaux e alguns dos vinhos mais caros do mundo, passou a permitir uvas estrangeiras em seus blends para manter o perfil de sua bebida caso alguma cepa tradicional da região venha perecer com as médias de temperatura cada vez mais altas.
No Hemisfério Sul, em 2023, uma forte onda de calor assolou o Chile, causando incêndios de grandes proporções nas regiões de Itata e Bio Bio, levando a um decreto de estado de catástrofe. Essas são áreas ocupadas principalmente por pequenos produtores super dedicados ao cuidado com a terra, que fazem resgate de uvas e vinhas ancestrais. Teve gente, como o enólogo Leonardo Erazo Lynch, da Rogue Vine, que perdeu 90% de seus vinhedos antigos. Para quem faz vinhos, essas vinhas velhas são como um tesouro.
Mas nada disso é maior do que a necessidade de se focar no que mais importa agora, a tragédia humana. Produtores da Serra Gaúcha e região ouvidos pela coluna falam em tantas perdas, luto e destruição que é difícil neste momento “pensar em estrago nos vinhedos” ou mensurar a dimensão financeira, como diz Daniel Geisse, da vinícola Cave Geisse, de Pinto Bandeira. Ele dá o tom do que se enfrenta por ali ao afirmar que a prioridade é ter combustível para os helicópteros que efetuam o resgate. Luís Henrique Zanini, da Era dos Ventos, conta que este é o terceiro episódio em oito meses e claramente o pior de todos. “As mudanças climáticas vêm se acentuando de forma exponencial”, afirma.
No Instagram da plataforma Brasil de Vinhos, Heleno Facchin, sócio da Cooperativa Nova Aliança, mostra um rio escuro que corta a área onde havia vinhedos. A reconstrução, ele estima, deve levar três anos. Bruna Cristofoli, da Cristofoli Vinhos de Família, fala do trauma da perda do meio de vida de muita gente. “Se puderem, doem recursos para entidades. Há muitas que são sérias trabalhando. E comprem produtos do Rio Grande do Sul”, pede.
Seguindo a sugestão de Cristófoli, para os que podem ajudar dessa maneira, deixo aqui uma seleção de rótulos notáveis produzidos no estado: o Amitié Brut Rosé (R$ 69), vai de antes da refeição até o fim; o espumante Cave Amadeu Brut (R$ 95), fino, elegante e de bom custo-benefício da Cave Geisse; o branco Cristofoli Instinto Chardonnay, com boa estrutura e cremosidade (R$ 229); o tinto leve Garbo Cherry Bomb Clarete (R$ 114); o laranja moderninho Isto não é um Traminer (R$ 154), da Outro Vinho, salino e mineral, ótimo para acompanhar de moquecas a cozidos; e o Pizzato Fausto Cabernet Sauvignon 2022 (R$ 79), que tem uma pegada mais clássica, com ótima fruta e final mentolado.
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Fonte: Folha de São Paulo