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Jogando em casa, o Juventus perdia de 1 a 0 do Velo Clube na segunda divisão do Campeonato Paulista. O gol do atacante Caio Mancha, do time de Rio Claro, encheu o estádio da rua Javari, na zona leste de São Paulo, de “uuuuhs”. Mas uma turma, mesmo vestindo as cores grená e branco dos anfitriões, permanecia indiferente naquela manhã de domingo.
Faziam fila, no entorno da arquibancada, para comprar os doces daquele que a torcida conhece como “o seu Antônio Cannoli”. Desde 1970 as suas guloseimas disputam atenção com o que rola em campo e se tornaram indissociáveis do time da Mooca —são citadas nos cartazes e estampam até camisetas.
Em véspera de jogo, o cozinheiro de 74 anos arma uma operação de guerra que inclui a mulher, Fátima, e às vezes até alguns dos cinco filhos do casal preparando os doces madrugada adentro para vender no dia seguinte. Eles vêm em grandes caixotes de plástico e são vendidos entre R$ 10 e R$ 12, a depender do sabor.
“A tradição mesmo é com recheio de creme de baunilha ou chocolate”, diz. “Mas agora tem essa modernização aí, esses avanços, então meus filhos vieram com a ideia de fazer de doce de leite, frutas vermelhas, limão.”
Quando o estádio, com capacidade para 5.000 pessoas, está cheio, Antônio se junta à família para ajudar a escoar as vendas na banquinha armada sempre à esquerda de quem entra no estádio pela porta principal, ao lado de um busto de Pelé que lembra aquele que é tido como o mais belo gol da carreira do maior jogador da história, marcado ali na rua Javari.
O doceiro calcula que vende em torno de 600 unidades em dia de campeonato, e que é raro algo sobrar ao fim do jogo. Quando a partida é mais tranquila, ele costuma se juntar aos torcedores na grade.
A fila que se arma em torno de sua banquinha é tão grande que dá para perder facilmente uns 15 minutos ali. Uma vez comprados, os quitutes dão as caras no meio da torcida, embalados em caixinhas de isopor.
Engana-se quem pensa que Antônio Cannoli tem o mesmo sangue italiano que corre nas veias de boa porção dos moradores do bairro paulistano e que está também na origem do doce, que teria sido criado na Sicília e chegado ao Brasil na mala dos imigrantes do sul do país europeu.
Em seu RG constam o português Pereira e o espanhol Garcia como sobrenomes. É que aos dez anos, o então engraxate costumava prestar serviços a um casal de italianos do bairro da Vila Carrão e com eles aprendeu o preparo. Havia dias, lembra, que os ajudava a enrolar, fritar e encher os quitutes.
“Eu via todo mundo vendendo doce e queria vender também”, conta. “Saía pela rua do bairro levando os cannoli numa caixinha de uva pendurada no pescoço com barbante.”
Fez adaptações, bem à moda paulistana. Sua receita do cannolo (forma singular do plural “cannoli”) não leva ricota, leite ou ovos, que poderiam estragar tanto tempo fora da geladeira. Tampouco banha, vinho marsala ou cachaça, como há em outras receitas. “A minha só leva água, farinha de trigo especial e sal. Vou mexendo até essa mistura ficar homogênea.”
A massa é então frita no óleo e depois enrolada num tubinho. Na primeira mordida, a casquinha se quebra, enchendo a boca com o recheio escolhido, sempre muito farto. É uma bomba de açúcar que dá uma leve pico de adrenalina.
Caso não haja guardanapos à disposição, o resultado pode ser uma pequena catástrofe com o creme caindo por toda a parte, sujando a boca. O de limão tem algum gosto de musse. O de baunilha é uma opção mais segura para os que querem experimentar o quitute.
Quando não está no estádio, Antônio monta a sua banquinha de cannoli num canto próximo da entrada da atacadista Assaí da Vila Carrão, na altura do número 42 da rua Manilha, sempre depois das 14h. “Meus clientes são fiéis, me ligavam toda hora. Eu precisava de outro cantinho fixo.”
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Fonte: Folha de São Paulo