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O meme “R$ 2 ou um jantar misterioso” nunca fez tanto sentido na Timeleft, plataforma que conecta pessoas que nunca se viram. Ela surgiu em Portugal há um ano, está presente em 12 países e acaba de chegar ao Brasil.
Neste caso, é você que paga pelo jantar misterioso –de R$ 39,99 a R$ 199, dependendo do plano. Após responder um extenso formulário, que inclui perguntas sobre gostos pessoais e personalidade, um algoritmo o conecta a cinco pessoas para um jantar num lugar desconhecido. É como um Tinder gastronômico.
“Conheça pessoas tão fascinantes quanto episódios do teu programa de TV favorito”, diz a propaganda. Os encontros ocorrem às quartas-feiras, às 20h, em sete capitais brasileiras. Fui a um desses jantares em São Paulo numa quarta do mês passado, sem me identificar como repórter. O endereço é informado apenas na manhã da reunião.
O local da vez foi a Ceia Clandestina, que não era bem restaurante, mas um projeto que promove jantares mensais em Pinheiros. Logo ao chegar, deu para perceber que o Timeleft é usado por muitos como um app de relacionamentos. O próprio marketing da marca incentiva essa ideia.
As mulheres e homens ali, com idades entre 20 e 40 anos, capricharam no visual. Davam uma espiada tímida nas mesas ao lado, para ver se encontravam alguém mais interessante no vizinho.
Quando cheguei, tinha apenas um cara na minha mesa. Começamos uma conversa que parecia de um date mesmo. Nome, profissão, o que gosta de fazer e por aí vai. Ele, que se apresentava a todos como agroboy, acabou sendo o protagonista da noite.
Talvez pela falta de tato ou dificuldade extrema de interagir, fazia piadas constrangedoras –que às vezes beiravam escatologias e crimes. “Gente, vocês já mataram um velhinho?”. Criava histórias para dizer “brincadeira, é mentira”. De início, tirou risos confusos. Depois, ninguém mais tentava entender.
Enquanto ele emendava a segunda cerveja, pedi uma água. Primeiro erro. Chegou à mesa um copo com uma pedra de gelo que tinha pontos marrons duvidosos dentro. Achei mais seguro beber a água direto da garrafa. Nem arrisquei provar os drinques –importantes para socializar–, que vinham caprichados de gelo.
O menu de comes trazia três pratos principais. O segundo erro foi pedir carbonara, que era tudo menos carbonara de verdade. Demorou para chegar e o macarrão não estava cozido o suficiente. A massa estava dura e virava uma farinha ao mastigar. Foram R$ 60 muito mal gastos.
Uma chuva que começou pouco antes das 20h fez com que muitos se atrasassem ou cancelassem a participação. Quem chegava atrasado fazia o grupo repetir as mesmas apresentações protocolares.
As únicas informações que sabemos sobre os desconhecidos, liberadas um dia antes no app, são o signo, área de trabalho e nacionalidade. Por causa de um erro, os nomes e sobrenomes dos participantes foram exibidos quando eles marcaram a opção de que que iam chegar tarde. Era, portanto, fácil stalkear os futuros acompanhantes nas redes sociais. Optei por manter o mistério.
Do nosso grupo, duas pessoas não foram, entre elas uma colombiana. A plataforma parece fazer sucesso em outros países. Na confraternização ao lado, tinha um inglês. Incorporamos duas mulheres que estavam sozinhas na mesa delas.
Para ajudar a quebrar o gelo, o aplicativo libera um jogo de perguntas, disponível apenas em português de Portugal, o que deixa mais cômico. As questões começam bobas, como “qual foi a última série que maratonou?”, mas descambam para “já foi vítima de discriminação ou preconceito?”, “já viveu uma perda que mudou profundamente sua visão de vida?”
Perguntas pesadas para pessoas que nunca se viram e que logo baixavam o humor do grupo. Talvez até funcione com os europeus, mas por aqui não cola. O pessoal queria saber de sexo, e o agroboy mandou um “qual foi o lugar mais inusitado em que vocês transaram?”. A conversa foi desse nível em diante.
No meio do jantar, a plataforma sugere um bar para fazer o after. Os participantes, no entanto, não sabiam dessa parte ou não entenderam como funcionava. Ficamos por lá mesmo.
Quem provavelmente fez o próprio after foi um dos nossos comensais, recém-saído de uma sessão de harmonização facial. De olho na mesa do lado, encontrou um boy que ele descobriu ter ignorado nas redes sociais no passado, mas por quem, pessoalmente, ficou interessado.
Passou o jantar o encarando de forma apaixonada, enquanto o incentivávamos a tomar iniciativa. Um dos colegas, sem paciência com esse que virou um dos assuntos principais, gritou o nome do crush alheio. Funcionou. Os dois se cumprimentaram e prometeram continuar a conversa depois.
Não fiquei para descobrir o fim da história. Duas pessoas foram embora por volta das 22h30. Minha bateria social já estava acabando e preferi voltar para casa também.
Depois do encontro, acessamos uma aba para avaliar o grupo e a experiência. Caso a gente queira continuar o papo com alguém, damos um like e, se der match, um chat é aberto. Dei dislike em todos. No fim, seriam pessoas que eu não convidaria para jantares. Rolê de gente esquisita.
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Fonte: Folha de São Paulo