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O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, apresenta aos governadores nesta terça-feira (26) um projeto de lei de renegociação da dívida dos estados com a União. O projeto vem na esteira de discussões com os líderes dos estados do Sul e Sudeste, os mais endividados do país, que têm ocorrido desde o início do mês.
As negociações foram lideradas pelo governador do Rio Grande do Sul, Eduardo Leite, mas Haddad se reuniu também com os governadores Tarcísio de Freitas, de São Paulo, Romeu Zema, de Minas Gerais, e Cláudio Castro, do Rio de Janeiro.
Os respectivos estados concentram, sozinhos, 87% da dívida consolidada líquida de todos os entes da federação, estimada em R$ 826,4 bilhões no fim de 2023. São Paulo, líder do ranking, com R$ 293,47 bilhões em dívidas em 2023, é o que menos preocupa, devido à economia pujante.
Já Minas Gerais, com R$ 166,13 bilhões; Rio de Janeiro, com R$ 154,91 bilhões; e Rio Grande do Sul, com R$ 104,90 bilhões em dívidas figuram como caso extremo, classificados como estados superendividados.
Segundo informações vazadas à imprensa por fontes do governo, o projeto vai trazer como novo parâmetro para a correção o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo, IPCA, mais 3% ao ano. Hoje, os débitos são corrigidos por IPCA mais uma taxa real de 4% ao ano.
Os estados pleiteiam uma correção fixa de 3% ao ano, além da revisão do estoque, que proporcionaria uma redução de 15% no valor a ser pago. A reivindicação foi considerada inviável pela equipe econômica e o projeto já recebeu aval do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). Nada indica que a proposta trará o fim do impasse.
Endividamento estrutural é bancado pelo Tesouro
A prática da repactuação das dívidas estaduais é recorrente desde 1997, quando foi feita a primeira grande consolidação dos débitos após o Plano Real. Desde então, sempre que os estados enfrentam desequilíbrios nas contas, apelam ao Tesouro e conseguem alívio nos débitos.
As dívidas são feitas por meio de empréstimos diretos do governo federal ou via crédito do mercado financeiro, em que os entes estabelecem a União como garantidora. Em fevereiro de 2024, por exemplo, o Tesouro Nacional pagou R$ 1,22 bilhão em dívidas atrasadas de estados, segundo o Relatório de Garantias Honradas pela União em Operações de Crédito.
Geralmente, o Tesouro cobra as contragarantias, como a retenção de repasses da União para o estado devedor – receitas dos fundos de participação e Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS), além de multa, juros e custos operacionais.
Nos últimos anos, no entanto, decisões do Supremo Tribunal Federal (STF) impediram a execução das contragarantias de vários estados em dificuldade financeira. A Corte também mediou negociações para inclusão ou continuidade de governos estaduais no regime de recuperação fiscal (RRF), que prevê o parcelamento e o escalonamento das dívidas com a União em troca de um plano de ajuste de gastos. Goiás, Rio de Janeiro e Rio Grande do Sul fecharam acordos com o governo federal.
Mudança no modelo do ICMS agravou situação fiscal
Em 2022, o problema cíclico do pagamento dos estados de dívidas com a União foi agravado pela lei que limitou a cobrança do Imposto sobre Circulação de Mercadorias (ICMS) sobre combustíveis, energia elétrica e comunicações, promovidas pelo ex-presidente Jair Bolsonaro, no contexto das eleições presidenciais.
Haddad criticou reiteradas vezes a decisão, que, segundo ele, prejudicou os governadores com uma desoneração não aprovada em suas assembleias do imposto que resultou numa perda estimada de R$ 80 bilhões de arrecadação. O ministério da Fazenda alega já ter desembolsado de R$ 14,8 bilhões a estados e municípios como compensação pela redução do ICMS. Em 2025, o governo ainda terá que pagar mais R$ 4,5 bilhões, totalizando R$ 27 bilhões.
Além disso, os estados foram contemplados na reforma tributária com dois fundos financeiros cujos aportes somarão R$ 790 bilhões nos próximos 20 anos. O primeiro, um fundo de compensação de benefícios fiscais e financeiro-fiscais do ICMS, para substituir os atuais incentivos estaduais que hoje provocam a chamada guerra fiscal. O segundo, o Fundo Nacional de Desenvolvimento Regional (FNDR), visando reduzir desigualdades regionais e sociais.
Mesmo assim, as mudanças no modelo do ICMS têm sido utilizadas como argumento para os governos estaduais intensificarem a arrecadação. Segundo levantamento do Comitê Nacional de Secretários de Fazenda dos Estados e do Distrito Federal (Comsefaz), dez estados e o Distrito Federal vão aumentar os impostos ao longo deste ano.
Proposta prevê obrigações orçamentarias
A proposta de projeto de lei do governo deve trazer a obrigação de governadores aplicarem sobras orçamentárias decorrentes da renegociação em investimentos estruturais e sociais. A ideia é evitar gastos com pessoal, que tem ocorrido com reajustes de salários pelos governos estaduais, apesar da falta de recursos.
O aumento das despesas com folha de pagamento e o crescimento menor na arrecadação têm agravado a situação fiscal dos estados de forma generalizada. Desde o ano passado, governos estaduais têm esbarrado no limite de gastos com pessoal estabelecido pela Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF).
Segundo a Secretaria do Tesouro Nacional, nos 12 meses até agosto de 2023, oito unidades federativas haviam superado o chamado limite prudencial de despesa com o funcionalismo do Poder Executivo, que corresponde a 95% do teto legal: Rio Grande do Sul, Paraíba, Rio de Janeiro, Amapá, Minas Gerais, Acre, Roraima e Rio Grande do Norte.
O argumento de técnicos das secretarias de Fazenda estaduais é que não é possível manter salários congelados. Mas o controle dos gastos públicos e reajustes dos servidores estaduais estão na mira de agentes públicos e privados.
O caso do Rio de Janeiro, que está no RRF desde 2017, é emblemático. Dados do Tesouro indicam que, nos últimos dois anos, o Rio gastou mais em expansão de pessoal do que no pagamento de sua dívida. Entre 2021 e 2023, o aumento da folha foi de R$ 17,5 bilhões, incluindo Legislativo e Judiciário, enquanto o estado pagou apenas R$ 5,6 bilhões de sua dívida.
Frente de insatisfação dos estados bons pagadores
Além do olhar atento da União, uma apuração da Folha de S. Paulo deu conta de que, com a decisão de renegociação do governo, uma frente de insatisfação foi aberta entre governadores do Norte e Nordeste. Os principais beneficiados coma a renegociação na região são Bahia, Pernambuco e Alagoas, mas com um montante de dívida bem menor, de R$ 43 bilhões.
Menos endividados, eles criticam a flexibilização para entes federativos que descumpriram regras, concederam reajustes sem as devidas compensações ou recorreram à Justiça para não pagar as prestações da dívida em dia.
Ainda reivindicam compensações para suas regiões, com medidas que “premiem” os bons pagadores, como mais acesso a crédito para investimentos, taxas de juros menores e prioridade na indicação de projetos do PAC (Programa de Aceleração do Crescimento).
A proposta do governo é aguardada com expetativa. Economistas e parlamentares veem soluções diferentes para a questão. Felipe Salto, da Warren Investimentos, disse ao O Globo que o projeto de lei com novo indicador de cálculo da dívida não vai solucionar o problema estrutural do déficit dos estados, que passa pelo corte de gastos e alongamento dos prazos.
O deputado Pedro Paulo (PSD-RJ) defende a criação de um “Desenrola” para os estados superendividados, com um corte inicial de 15% no estoque da dívida e descontos adicionais em três magnitudes – 5%, 10% e 15% -, à medida que os estados melhorem os indicadores sociais.
O governador Cláudio Castro, que já havia manifestado disposição de recorrer ao STF para rediscutir a dívida, disse à Agência Brasil que espera um acordo da reunião com Haddad. “Ficamos de esperar até o dia 26 para que a gente tente, em mais uma rodada de negociação, colocar aquilo que o Rio de Janeiro entende como justo”, disse Castro. Para ele, além da natureza da dívida em si, o estado quer tratar dos indexadores futuros, dos juros e multas e da revisão do regime de recuperação fiscal.
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Fonte: Notícias ao Minuto