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Aprovado na Câmara dos Deputados com ampla margem de votos, com a promessa de dinamizar a geração de empregos e promover a indústria renovável, o projeto “Combustível do Futuro” ainda tenta pacificar as preocupações sobre qual será o impacto do aumento de teor do biodiesel ao óleo diesel, e do etanol à gasolina, nas engrenagens dos motores que rodam o país.
Pelo projeto, que agora segue para o Senado, a mistura de biodiesel no diesel fóssil passa a ter um patamar mínimo de 13% (atualmente está em 14%), com meta de aumentar 1% ao ano, chegando a 20% em 2030, e teto de 25%. Os aumentos não serão automáticos, mas dependerão de análise e aprovação do Conselho Nacional de Política Energética (CNPE), mantendo assim o poder decisório com o governo.
Já em relação ao etanol, o projeto aprovado passa a permitir mistura máxima de 35% de álcool anidro (hoje é de 27,5%), e muda o limite mínimo de 18% para 22%. O relator, deputado Arnaldo Jardim (Cidadania-SP), elevou o teto proposto pelo governo, que era de 30%.
A Associação Brasileira de Engenharia Automotiva (AEA), um fórum neutro multissetorial, mantém ressalvas e preocupações quanto aos possíveis impactos do aumento das misturas de combustíveis renováveis nos motores de veículos não projetados para isso.
AEA adverte para consequências incertas
Segundo a Associação Brasileira de Engenharia Automotiva, sem testes em condições reais de uso nas rodovias, e por período de tempo maior, trata-se de uma aposta com consequências incertas.
“Dependendo da categoria de caminhão, o Proconve exige a garantia das emissões até 700 mil km. Para isso seria preciso no mínimo quatro anos de rodagem. A preocupação é permitirmos um teor de biodiesel agora e, lá na frente, verificarmos que estamos prejudicando muito mais o meio ambiente. A emenda pode ficar pior do que o soneto. Você está preocupado com as emissões de CO2, que afeta a camada de ozônio, mas não pode se esquecer dos componentes locais. Por que se prejudicar o sistema de emissões, vai prejudicar o controle da emissão de monóxido de carbono, de óxido de nitrogênio e hidrocarbonetos”, afirma Rogério Gonçalves, diretor de combustíveis da AEA.
Tal preocupação é refutada pelo diretor-técnico da Frente Parlamentar Mista do Biodiesel (FPBio), João Henrique Hummel. Ele apresenta laudos técnicos de fabricantes de motores Volvo e Scania dando conta que é seguro rodar caminhões com mistura mais elevada de biodiesel. Inclusive, grandes grupos econômicos – como JBS e Amaggi – já estariam montando novas frotas com 100% de biodiesel.
Outros países já têm misturas mais elevadas de biodiesel
Sobre a necessidade
de testes em condições reais, e durante mais tempo, Hummel diz que os
resultados já são conhecidos. “Vários países do mundo têm mistura maior do que
a B15. Na Indonésia já chega a 40% e nos Estados Unidos a 30%. O problema é que
só falam da Europa”, enfatiza.
Um problema intrínseco
ao biodiesel estaria em sua higroscopicidade (absorção da umidade do ar),
segundo a Associação de Engenharia Automotiva. “Ele absorve água, ela fica
emulsionada no produto e isso pode provocar oxidação e produção de fungos e
bactérias de forma acelerada”, pontua Rogério Gonçalves. Os riscos de
comprometimento aumentam, segundo ele, dependendo do tempo de armazenamento do
combustível.
“Indo para
casos extremos, nesses postos que vendem muito pouco, pode ocorrer essa
formação de bactérias e de goma, e provocar o travamento da bomba dispensadora
e dos componentes da linha de combustível do motor”, acrescenta.
Os defensores do biodiesel rebatem e argumentam que a perda de qualidade não é um risco somente do combustível renovável, mas já é conhecida há décadas com derivados do petróleo.
“Parafina de petróleo também entope motores”
“Por acaso
não existia borra para quem trabalhou no campo, na década de 90, quando não existia
o biodiesel? Não existiam problemas nos bicos ou nos filtros? Existe uma coisa
chamada parafina, que provoca a mesma coisa. Seja diesel ou biodiesel, tem que
cumprir o manual de boas práticas, dar a manutenção necessária para que não
ocorram problemas. O diesel é um produto higroscópico, então com o diesel ou
biodiesel ocorre o mesmo problema”, afirma Hummel.
Em acordo,
tanto a AEA quanto a FPBio entendem que o inimigo comum a ser combatido na
qualidade do diesel ou biodiesel é a presença de água. “Deve ser uma
preocupação constante, porque os tanques, seja da refinaria, da distribuidora
ou do posto, têm respiro, e com o respiro entra a umidade. Quando muda a
temperatura, ela se condensa e vai para dentro do tanque. É preciso um
procedimento regular para drenar esse produto, retirar essa água”, destaca Gonçalves.
Redobrar os cuidados com as boas práticas pode fazer a diferença e ajudar a detectar de onde vêm, realmente, os problemas de engasgos, entupimentos e quebras de componentes. O setor de biodiesel defende um programa de rastreabilidade que assegure a qualidade do produto que chega às máquinas e caminhões.
Necessidade de rastrear origem dos problemas
“Se um caminhão
para, e foi só um caminhão, o problema é do biodiesel? Ou pode ser da manutenção
do caminhão? Se acontece com dez caminhões que abasteceram no mesmo local, do
mesmo fabricante, daí pode ser problema do posto, de quem distribuiu, de quem
forneceu ou pode ser problema do biodiesel. A Agência Nacional de Petróleo
(ANP) registra menos de 1% da utilização do biodiesel com problema. Mesmo assim,
fazem esse carnaval. Será que o problema está no biodiesel mesmo?”, questiona
Hummel.
Nas contas da
Frente Parlamentar Mista do Biodiesel, a mudança da legislação, ampliando as
misturas do biodiesel ao diesel, tem o potencial de uma forte alavanca
econômica. Em teoria, as 150 milhões de toneladas de soja produzidas pelo
Brasil poderiam render 30 bilhões de litros de óleo de soja e 120 milhões de
toneladas de farelo. Tanto farelo impulsionaria a produção de carne, contanto
que se achasse um destino para os bilhões de litros de óleo vegetal excedentes.
O consumo humano, no Brasil, é apenas de 3,7 bilhões de litros. O biodiesel se
propõe a preencher esta lacuna, aumentando a demanda pelo óleo e gerando
excedente de farelo para a pecuária.
“Em termos de valor, quando vendo soja, eu vendo 1. Quando vendo farelo, vendo 2, e quando vendo carne, vendo 10. Saio de um emprego para 15 empregos. Isso é uma política de fortalecimento da agroindústria brasileira, de agregação de valor ao produto brasileiro e de industrialização”, defende Hummel, que cita ainda os benefícios diretos de melhoria da qualidade do ar e redução das importações de diesel.
Preocupação com carros antigos à gasolina e com importados
Outra preocupação
da Associação Brasileira de Engenharia Automotiva se relaciona ao impacto de
uma mistura maior de álcool anidro na gasolina, que poderá sair de 27,5% para
até 35%. Não haveria implicações para os modelos flex, já concebidos para isso,
a não ser pelo aumento de consumo, visto que o etanol é menos calorífico.
O temor,
contudo, envolve os carros mais antigos à gasolina e os importados, que podem vir
a engasgar com o aumento da mistura. “Os importados foram preparados para rodar
com uma mistura de 27%, e não com 30% ou 35%. A gente não sabe o que vai acontecer.
Os carros à gasolina antigos podem ter falha de funcionamento, engasgos, falha
de aceleração que coloca em risco uma ultrapassagem e pode causar até um
acidente. E na região Sul ainda tem o problema da partida à frio. Então, será
preciso estudar melhor”, diz Gonçalves, da AEA.
No mesmo dia da aprovação do projeto Combustível do Futuro pelos deputados, o Ministério das Minas e Energia (MME) criou um grupo de trabalho para estudar a viabilidade do aumento da mistura de etanol à gasolina, dos atuais 27,5% para 30%. Por enquanto, apenas órgãos governamentais integram o grupo de trabalho. A AEA já se colocou à disposição para contribuir com o debate.
Gasolina premium mantém limite de 25% de álcool anidro
Em 2014, quando
se discutia o aumento da mistura de álcool anidro à gasolina, de 25% para 28%, a
elevação não foi aprovada porque a Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos
Automotores (Anfavea) se opôs, argumentando que não havia definição técnica
sobre o impacto nos carros importados, e que o governo poderia ser responsabilizado
caso houvesse necessidade de recall dos veículos para manutenção.
Para não deixar veículos à gasolina mais antigos e importados na berlinda, criou-se então uma alternativa, ainda desconhecida de muitos consumidores, e mais cara, que é a disponibilidade de mistura de 25%, na forma de gasolina premium em alguns postos. Apostar nessa alternativa, e torná-la mais comum no país, é um desafio. “O governo poderia tentar fazer isso daqui para frente, ter duas gasolinas no mesmo posto. Mas daí entramos num problema logístico, muitos postos não têm dois tanques, não têm duas bombas”, afirma Gonçalves, da AEA.
Contatada, a Anfavea, por meio da assessoria, repassou posicionamento da instituição apresentado pelo presidente, Marcio de Lima Leite, em coletiva de imprensa no dia 7 de março. Leite afirmou que a Anfavea é favorável à descarbonização e apoia, assim, a política de incentivo aos biocombustíveis. “A Anfavea trabalha para apresentar estudos técnicos de todas as montadoras, das universidades e do setor de autopeças. Pra gente analisar cuidadosamente até onde se pode ir. E esses estudos não são tão rápidos, porque você tem um momento com clima de verão, depois tem de testar e fazer análise sobre como vai se comportar no inverno. Tem os testes em laboratório e também na rua”, afirmou.
Sobre os temores de que o aumento da mistura de etanol à gasolina possa comprometer o desempenho de carros à gasolina mais antigos e os que são importados, a reportagem entrou em contato com o relator do projeto na Câmara, deputado Arnaldo Jardim, e também com a União da Indústria da Cana-de-Açúcar (Unica). Não houve retorno até a publicação desta matéria. O espaço segue aberto.
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Fonte: Notícias ao Minuto