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O ator e diretor Marcos Caruso diz, bem-humorado, que tem “uma sopa de letrinhas” dentro de sua cabeça. Isso porque ele vai passar as próximas semanas se dividindo entre duas cidades e dois papéis. No ar na novela “Elas por Elas”, da TV Globo, interpretando o vilão Sérgio, Caruso grava as cenas do folhetim nos estúdios da emissora, na capital fluminense, entre as segundas e as sextas-feiras.
Já no fim de semana embarca, rumo à capital paulista, para uma nova temporada da peça “Intimidade Indecente”, que estreou em 2001 e sempre volta em cartaz. Desta vez, a estreia, no sábado (9), foi no Teatro Renaissance, em São Paulo. “Eu estava aqui, decorando texto da novela”, afirma Caruso, apontando para o computador apoiado na mesa de seu apartamento em Ipanema, na zona sul do Rio, durante entrevista à coluna por videochamada. “Quando a gente desligar, vou continuar.”
“É uma coisa que consegui com a minha persistência mesmo. A Globo, independentemente da novela [em que está trabalhando], sempre me liberou para fazer teatro. Teatro é o meu oxigênio, é a minha vida. Tudo o que eu tenho, devo ao teatro. Financeiramente, emocionalmente.”
Sobre a agenda dupla aos 72 anos, o ator diz que “era mais fácil antigamente”. “Estava mais jovem, mas ainda encaro numa boa”, afirma. “No palco, você não é você. Não sente dor, não sente cansaço”, diz, antes de completar, entre risos: “Mas depois, sente. Quando acaba a peça, você vai para o quarto do hotel e está morrendo [de cansaço]”.
Em “Intimidade Indecente”, Caruso divide a cena com Eliane Giardini. Com apenas um sofá no cenário, os dois vivem um casal, já na casa dos 60 anos de idade, que está se divorciando. A montagem acompanha as décadas seguintes da dupla. Não há troca de figurino nem maquiagem —o passar do tempo e o envelhecimento são dados pela linguagem corporal e pela interpretação dos dois.
Os atores se conheceram nos anos 1970. “A gente vinha se namorando profissionalmente há muitas décadas”, fala Caruso sobre sua parceira em cena. O primeiro trabalho juntos foi na novela “Avenida Brasil” (TV Globo), em 2012. Eles interpretaram o icônico casal Leleco e Muricy na trama de sucesso de João Carneiro.
A química da dupla é palpável, admite Caruso. “Não somos fechados, engessados. Se ela fala uma coisa diferente, eu entro na dela. Então, para a plateia, é um deleite. Eles percebem que existe uma intimidade indecente entre nós.”
Desde a estreia, em 2001, a peça já teve sucessivas temporadas no Brasil e em Portugal. Marcos Caruso fez o papel desde o início. O seu primeiro par foi Irene Ravache. Depois, entrou Vera Holtz, e então, Eliane Giardini.
Caruso diz que não aprecia repetir trabalhos. “Gosto de não saber qual é o próximo [projeto], de ser surpreendido pela minha profissão e pelas escolhas. Muitas vezes nem sou eu que as faço, mas sou escolhido para [algum trabalho]”, afirma.
Em 2022, topou fazer uma nova temporada de “Intimidade Indecente” em terras lusitanas. —afinal, por que não? “Fico três, quatro meses em Portugal. Faço teatro, como bem, me divirto, viajo, sou feliz”, afirma, gargalhando. “Só que o bichinho [para estrear novamente com a peça no Brasil] mordeu de novo.”
Nas palavras de Caruso, a produção teatral “precisa ser vista por essa nova geração”. “A peça é um clássico. Fala de relacionamentos, de amor, de solidão, de família, das necessidades do outro. Os mais velhos riem muito, e os mais jovens choram muito”, diz.
“O cara mais velho já passou por tudo aquilo. E a proximidade da morte é mais real. Então, ele ri muito porque ele já conhece, já viveu isso. Ele se reconhece no palco. A finitude passa a ser uma decorrência natural da vida e da idade”, explica.
“O jovem, não. E quando começa a ver que o fim da vida de todos nós é aquilo que está sendo mostrado no palco —porque tem um golpe de teatro incrível no fim da peça que dá uma puxada no tapete do público—, chega às lágrimas”, completa.
E como Caruso encara a finitude da vida? “Eu amo ficar velho. Não dá para voltar para trás. Dá para fazer as coisas de uma forma mentirosa. Minto que não tenho rugas e faço uma plástica. Minto que não tenho mancha e tiro as manchas”, diz, passando a mãos pelos seus braços e rosto.
“Se te faz bem, ótimo. Só que, por mais que você faça tudo isso, você está envelhecendo. Eu não quero ficar jovem. Quero ter a idade que eu tenho e quero conhecer [essa fase]. A curiosidade me leva a ter interesse pelo envelhecimento. Não tenho nenhum medo de morrer. Tenho medo de ficar doente e sofrer. Aí, não dá.”
Caruso se descreve como um homem “absolutamente apaixonado”. Desde 2018, está em uma relação com o técnico de enfermagem Marcos Paiva. “Desta vez é para sempre. Está bom demais. Está muito bom”, derrete-se ao falar do marido, rindo.
O ator foi casado 20 anos com Jussara Amaral e teve outras duas relações duradouras, também com mulheres. É a primeira vez que se relaciona com um homem. “Foi o olhar de duas pessoas que bateu. Não foi um olhar de tesão, de ‘ah, eu quero’. Nem da minha parte, nem da dele”, lembra, sobre o começo da relação.
“Foi um olhar de: ‘Quem é essa pessoa que está aí dentro?’. E dizer: ‘Oi, abre a tua porta’. E já estava aberta. E pensar: ‘Caraca, que pessoa interessante. Que papo interessante. Que humor, que risada. Que alegria, que história de vida. Que propostas boas para o presente, que propostas boas para o futuro’. Aí, foi ficando mais que amizade”, conta.
Até então, a ideia de se relacionar com um homem “nem passaria” pela sua cabeça, afirma o ator. “É surpresa porque é novo. Mas é uma surpresa que você quer abrir. Tipo um Kinder Ovo. E você fala: ‘O que tem aí dentro?’ É uma surpresa boa, que não me choca. Você abre o pacote e fala: ‘Caraca, que coisa incrível, como é que usa isso, como é que faz, como é que resolve?’”
“Mas o que nos une é o fato de nós termos, no outro, aquilo que nós gostaríamos de ter na vida, para sempre. É cumplicidade, é paz do espírito.”
Caruso renovou o seu contrato com a Globo em abril de 2022, na contramão de um movimento da emissora de dispensar atores com longos acordos de exclusividade. “Eu entendo essa postura da Globo. Não tem sentido pagar oitocentos atores para ficar em casa”, analisa.
“Naquele momento [2022] eles já podiam, digamos, ter me dispensado, mas acabei fazendo três novelas seguidas [“Quanto Mais Vida, Melhor!”, “Travessia” e “Elas por Elas”]. Antes, você fazia uma novela e ficava sete meses para ‘descansar a imagem’, como eles diziam. Eu não descansei porra nenhuma”, segue, rindo.
O contrato com a emissora vai até abril do próximo ano. Ainda não houve nenhuma conversa com a Globo, e Caruso diz, com naturalidade, que não deve haver uma renovação. “Ninguém falou nada, mas acho que nem precisa.”
Ao olhar em retrospecto para a sua trajetória na Globo, o ator elege dois trabalhos que considera como “divisores de água” na sua carreira nas telinhas.
O primeiro foi quando viveu Alex, na novela “Páginas da Vida”, em 2006. “Foi quando fiz, pela primeira vez na Globo, um papel dramático. Até então, era sempre meio cômico, leve [seus papeis]. Ganhei prêmio de melhor ator. E, a partir dali, começaram a me chamar e me reconhecer pelo nome. Não era mais o pai da Dóris [em referência ao seu papel em “Mulheres Apaixonadas”, o Carlão, pai da personagem vivida por Regiane Alves].”
O segundo foi justamente Leleco, de “Avenida Brasil”. “Fiquei conhecido dentro e fora do país. Foi [um personagem] muito popular. Me paravam na rua a cada esquina”, recorda. Caruso reforça que não começou na emissora cedo. “Entrei com 50 anos. As pessoas acham que estou há 50 anos trabalhando na Globo. Não. Estou há 20”.
No campo da política, Caruso celebra o retorno do Ministério da Cultura no governo Lula e defende os programas de fomento cultural. “Não somos mamadores da Lei Rouanet. Nós usamos uma ferramenta do governo e prestamos contas. Não gastamos o dinheiro onde bem entendermos.”
“Se o governo não está atento a essa questão de [prestação de] contas, o problema é do governo. O problema não é nosso. Se alguém infringiu alguma regra, essa pessoa tem que ser punida, como várias pessoas foram”, pontua.
“Nós fomos estigmatizados durante quatro anos, tidos como pessoas non gratas por esse governo de plantão [o de Jair Bolsonaro]. Foi muito ruim pra nós. Está melhor agora, é claro. As coisas estão se abrindo, as pessoas estão produzindo, os teatros estão lotados. E não é só o artista quem ganha. São todas as pessoas.”
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Fonte: Uol