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Pedir ajuda a um cientista para voltar ao passado e ser o cupido de seus pais ou sair pelas ruas de Paris depois da meia-noite para tomar uns gorós com Ernest Hemingway e Salvador Dalí. Viajar no tempo costuma ser motivo de entusiasmo, mas a habilidade poderia facilmente se tornar uma maldição, a depender do que os anos guardam.
É o caso de Adam, interpretado por Andrew Scott em “Todos Nós Desconhecidos”, que perdeu os pais em um acidente de carro quando tinha apenas 12 anos.
O roteirista vive solitário em um enorme edifício espelhado em Londres. Ele rejeita o flerte de Harry, vivido por Paul Mescal, único inquilino do prédio além dele, que oferece a sua companhia junto a uma garrafa de rum em uma noite. Um dia, Adam decide fazer uma visita à sua antiga casa de infância, quando se depara com seus pais —exatamente na idade em que morreram.
As roupas, a decoração e até a noção dos pais do mundo lá fora —tudo no interior da casa parece ter sido congelado na década de 1980. Adam é recebido como se estivesse finalmente visitando seus pais. A partir daí, ele fica obcecado em frequentar a casa na tentativa de reconstruir memórias do que não viveu, enquanto tenta engatar um romance com Harry paralelamente.
Ao contrário de empolgantes viagens pelo tempo, o filme de Andrew Haigh é sobre um roteirista que tenta reescrever suas memórias e, no processo, não consegue mais separar realidade de ficção. “A vida é uma sucessão de perdas, de pessoas e coisas. Para mim, o filme é sobre a importância do amor diante do luto”, diz o diretor sobre a adaptação de “Strangers”, livro do japonês Taichi Yamada. A principal diferença da obra original, além do final da trama, é que Adam é gay.
Enquanto cria intimidade com Harry, anos mais novo do que ele, o protegonista enfrenta também as diferenças geracionais que pairam sobre a comunidade LGBTQIA+. “Minha geração cresceu com medo de sua sexualidade. Era horrível pensar em ser gay na época da crise da Aids”, diz Haigh.
“Nós carregamos um trauma, e às vezes é difícil lidar com essa dor do passado. Mas, ao mesmo tempo, se para a nova geração as coisas estão muito melhores, também não são perfeitas.”
Harry é deprimido e não tem uma relação próxima com a família. De seu apartamento isolado, com vista distópica para uma Londres distante e pequena, ele também parece desconectado de seu tempo —ou das experiências de vida esperadas para alguém de sua idade, de acordo com as normas sociais.
“Algumas coisas que outras pessoas vivem em sua juventude, nós [pessoas queer] não conseguimos viver plenamente”, diz Haigh. Pessoas LGBTQIA+ experienciam, por vezes, o tempo de forma diferente. Exemplo é quando Adam comenta que seus amigos escolheram casas afastadas do centro para criar seus filhos, enquanto ele preferiu permanecer na cidade.
Adam tenta criar com Harry uma intimidade que não teve com os próprios pais, mas ao mesmo tempo não consegue cortar relações com os fantasmas de sua infância. A narrativa ganha um tom de terror, moldado pelo pavor da solidão. Mas Haigh tem uma visão otimista. “A verdade é que hoje podemos casar, ter filhos e todas essas coisas. Me interessa o que está no futuro”, diz.
“Me mostre como você foi amado, que vou te mostrar como você ama”, dizem, quase em um coro perfeito, Andrew Scott e Paul Mescal, em entrevista com jornalistas. A sintonia entre os dois, somada às cenas quentes, mas românticas e delicadas do filme, renderam aos atores vários convites para responderem, juntos, perguntas sobre amor e sexo em veículos como Vogue, Elle e Vanity Fair.
“O público constrói uma química a partir das expectativas que têm e da ideia excitante de ver duas pessoas juntas”, diz Scott, que já tinha bombado depois que interpretou um “padre gostoso”, como foi apelidado nas redes, pelo seu personagem na série “Fleabag”, de Phoebe Waller-Bridge.
A fama de galã também é compartilhada por Mescal, que protagonizou diversas cenas eróticas em “Normal People”. Apesar de já estar confirmado como o próximo Maximus na sequência de “Gladiador”, de Ridley Scott, o ator declarou diversas vezes que quer se manter no cinema independente.
“A melhor sensação é quando vou das gargalhadas às lágrimas, e me conecto com as outras pessoas na sala [de cinema]”, diz. Função que, segundo ele, “Todos Nós Desconhecidos” cumpre bem, por abordar um tema que, de alguma forma, toca a todos —como as relações amorosas são, no fundo, um reflexo de como fomos criados na infância.
“Eu acho que essa é a maravilha do cinema. Quando atuação e direção se juntam para permitir que outros humanos possam analisar a si próprios.”
Mescal deslanchou depois de sua interpretação em “Aftersun”, drama em que ele é um pai sensível e deprimido analisado pelo olhar de sua filha. “Atores homens estão trazendo cada vez mais vulnerabilidade para as telas. É um alívio não precisar repetir sempre a mesma coisa”, diz, provavelmente referindo-se aos galãs másculos e mulherengos que dominaram Hollywood desde sua criação.
“O que significa ser um homem? Ou uma mulher?”, questiona Andrew Scott. O ator, abertamente gay, também se sente aliviado com a abordagem de novas temáticas nas telonas. “Um homem pode ser másculo ou feminino, e não será menos homem por isso. Uma mulher pode se portar como quiser. É exaustivo precisar se comportar de um jeito específico.”
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Fonte: Uol