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A crise do azeite espanhol é um dos mais eloquentes efeitos das secas e ondas de calor que vêm assolando a Europa continental nos últimos anos.
E, se falta azeite na Espanha, amigui mío, pode faltar na sua casa.
O país é o maior produtor e exportador mundial, seguido (de longe) de Itália, Grécia e Portugal. Cerca de 65% de sua produção é exportada, num total de 40% do azeite consumido em todo o mundo.
Entre 2022 e 2023, o país experimentou uma queda vertiginosa de mais de 50% na produção. A previsão para 2024 é de uma ligeira recuperação, mas ainda muito inferior às perdas do último biênio.
Tem quem vaticine uma escassez sem precedentes para o segundo semestre deste ano, quando as baixas reservas não darão conta de cobrir o período entressafras.
Os reiterados prejuízos para o setor agrícola, associados a questões climáticas e políticas, culminaram recentemente em greves e protestos de agricultores por toda a Europa.
Com os preços batendo recordes históricos — atualmente, a média do litro está em torno de R$ 50, o dobro de apenas um ano atrás –, as grandes redes de supermercados espanhóis começaram a colocar alarmes nas garrafas dos azeites mais caros para evitar furtos.
QUADRILHAS E DRONES
Mas a alta histórica no preço desse item básico da mesa espanhola também tem atraído outro tipo de ladrões.
Em regiões olivícolas clássicas como Granada, Jaén e Sevilha, na Andaluzia, grandes operações da polícia civil vêm desbaratando um número crescente de quadrilhas dedicadas ao roubo e revenda ilegal de azeitonas destinadas à produção de azeite.
Com vans ou caminhões, os ladrões vandalizam plantações ou furtam diretamente de armazéns, revendendo o “botín” para almazaras (nome de origem árabe das instalações onde se realiza a extração de azeite por meio de prensas).
O problema se repete em outros países produtores como Itália e Grécia.
“Eles (os ladrões) buscam ramos muito carregados e os cortam. Com isso, não só roubam a azeitona como causam graves danos à árvore. São necessários de quatro a cinco anos para que ela volte à normalidade”, diz o grego Neilos Papachristou, que administra uma almazara, à Euronews.
Aliás, nem só de azeitonas vivem os ladrões — muitos deles vão direto à fonte, isto é, as próprias almazaras.
Como ocorreu em uma almazara de Córdoba, de onde foram roubados entre 50 mil e 60 mil litros de azeite de golpe — o equivalente a 500 mil euros de prejuízo, ou R$ 2,6 milhões. Os ladrões atuaram pela noite, conectando os depósitos a caminhões-pipa.
O azeite a granel é, claro, mais difícil de rastrear, e o caso segue em investigação.
Por outro lado, também há os que roubam o produto já embalado e pronto pra vender, como ocorreu em agosto de 2023 em Málaga.
Nesse caso, os ladrões furtaram engradados de azeite e ainda envasaram outros antes de deixar o local. A empresa, uma almazara familiar que coleciona prêmios com seus azeites de variedades picual, arbequina e hojiblanca — as três mais populares do mercado –, teve numa única noite um prejuízo de 50 mil euros (R$ 267 mil).
Segundo a polícia de Granada, cada roubo “médio” pode variar de algumas centenas de quilos de azeitonas até mais de uma tonelada. Além de flagrantes, a polícia também checa a traçabilidade das azeitonas em armazéns e pontos de revenda.
Entre outras, Granada, Jaén e Córdoba são conhecidas zonas produtoras da variedade picual, de sabor afrutado, picante e ligeiramente amargo.
Em Sevilha, estima-se que foram roubadas 70 mil toneladas de azeitonas durante a temporada de colheita de 2023. Este ano, a estratégia de vigilância da polícia local inclui até drones.
Alguns dos ladrões, atuando sozinhos ou em bandos, são falsos jornaleros (trabalhadores temporários) que vêm de outras zonas do país ou, tradicionalmente, do Leste Europeu para a temporada de colheita.
Em 2024, para compensar a crise no setor, o azeite de oliva espanhol passou a contar com a isenção de IVA (o Imposto sobre o Valor Acrescentado, aplicável a serviços e produtos dentro da União Europeia).
Ainda assim, a tendência é que os preços continuem subindo — embora, segundo consultores agrícolas locais como Daniel Trenado, seja preciso esperar a floração das oliveiras na primavera para fazer as primeiras previsões reais.
Ironicamente, como acontece com as uvas e o vinho, em tempos de seca a produção cai, mas a qualidade da safra tende a ser superior.
Segundo explica o jornalista ambiental Cesar-Javier Palacios, do portal espanhol 20 Minutos, isso se deve ao fato de que os frutos passam a concentrar mais “toda a essência que, em épocas chuvosas, é mais diluída”.
Em breve, estou vendo que teremos que pagar um fígado por um litro de azeite de oliva de lo bueno. Como consolo, pensemos no que comenta Palacios, que participou recentemente de catas das últimas colheitas: “a qualidade de azeite deste ano é das melhores da história”, afirma.
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Fonte: Uol