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Dois filmes de ficção científica que competem pelo Urso de Ouro seguem caminhos muito diferentes no Festival de Berlim. Enquanto um copia e cola a estética, o tom e as histórias de “Black Mirror”, o outro embarca numa paródia inesperada, isso porque seu realizador é o francês Bruno Dumont, um diretor conhecido pela violência crua de suas realizações.
O primeiro é “Another End”, ou um outro fim, do italiano Piero Messina, com o mexicano Gael García Bernal como protagonista. Num futuro próximo, uma nova tecnologia coloca a consciência de uma pessoa morta de volta num corpo vivo, numa tentativa de aliviar a dor da separação e conceder aos desolados um pouco mais de tempo para se despedirem.
Messina é um diretor que vem da televisão, tendo dirigido diversas séries italianas. Daí, provavelmente, a razão de seu segundo longa-metragem ser tão parecido com a série criada pela BBC e atualmente produzida pela Netflix. “Another End”, em suma, é um episódio de “Black Mirror” alongado para mais de duas horas.
Se a sinopse já indica isso claramente, a conclusão do filme também não encontra uma solução longe dos clichês. Melhor não entrar em detalhes aqui para não estragar a experiência de quem ainda vai assistir, mas a resolução final traz a lembrança de uma série de outros filmes ou contos do gênero, notadamente Philip K. Dick.
Gael García Bernal faz Sal, um homem arrasado pela morte da esposa em um acidente de carro, no qual ele dirigia e havia bebido. Então entra a grande empresa com a tal nova tecnologia. Com sua mulher de volta no corpo de uma hospedeira temporária, ele volta a sorrir. E obviamente Sal se interessará pela mulher que recebeu as memórias da falecida. Que, aliás, é uma prostituta. É mesmo um clichê atrás do outro.
Uma das atrações mais amadas da ficção científica é ver como o mundo será naquele futuro imaginado. Mas ou o diretor Messina não tem imaginação ou não levantou dinheiro suficiente, pois a cidade em que Sal vive é exatamente às de hoje. Parece que o único trabalho da direção de arte foi fazer um hall de entrada e alguns escritórios brancos para os funcionários da big tech.
“Talvez a coisa que eu mais goste nesse filme é que ele realmente pondera questão filosófica muito forte”, disse Bernal, na entrevista coletiva concedida na Berlinale. De duas, uma. Ou ele estava fazendo média com o diretor, que estava sentado ao seu lado, ou Bernal precisa urgentemente adquirir uma coleção completa de “Os Pensadores” nos sebos paulistanos.
Se “Another End” não consegue surpreender absolutamente ninguém, “L’Empire” é um sobressalto para qualquer fã do cinema seminal de Bruno Dumont. Após um início de carreira com alguns dos filmes mais chocantes dessa geração —ao lado do austríaco Michael Haneke, talvez—, o francês resolveu enveredar por algumas comédias nos últimos anos, como essa paródia sem pé nem cabeça de “Star Wars” passada num vilarejo pesqueiro no norte de seu país.
A graça aqui parece ser ver os pescadores e agricultores típicos da França declamando diálogos de uma luta intergaláctica entre o bem e o mal, mas sem abandonarem seus macacões de trabalho, tratores e cavalos. De vez em quando, um empunha um sabre de luz.
Dumont faz reciclagem na cara dura: aproveita dois inspetores desengonçados que criou para uma minissérie de TV e ainda usa as mesmas igrejas que aparecem em seus dois filmes recentes sobre Joana D’Arc. Só que, desta vez, essas catedrais são as naves espaciais que singram o cosmos.
Difícil encontrar algo para elogiar em “L’Empire”, mas pelo menos há uma relativa dose de sexo na tela para alivar a paciência. “Eu amo space operas, porque acho que são fascinantes a nível de entretenimento para apresentar questões complexas”, disse Dumont, na coletiva do festival, ao lado de seus atores e atrizes.
Talvez Bernal possa dividir aquela coleção de livros de filósofos com Dumont, porque, humor, definitivamente, não é a praia desse francês.
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Fonte: Uol