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São Paulo
Vestindo roupas claras, de algodão leve, com ar de simplicidade e, ao mesmo tempo, sofisticação, o fazendeiro Ernst Götsch foi o muso inspirador de Marie Salles, figurinista de “Renascer”, para criar o guarda-roupa de José Inocêncio, vivido por Marcos Palmeira na segunda fase da novela.
O suíço Götsch, dono de fazendas de cacau na região de Ilhéus, onde se passa a novela, é considerado o criador da agrofloresta, sistema de plantio que combina em uma mesma área o cultivo de espécies diferentes. Essa relação de amor e unidade com a terra é expressa na vestimenta de José Inocêncio desde a primeira fase do personagem, vivido por Humberto Carrão.
“Quando José Inocêncio surge na primeira fase, a gente não sabe de onde ele vem, então eu quis aproximar o tom da paleta do Carrão como se ele viesse da terra, como se ele brotasse do chão, como se ele fosse um só com aquela terra e com aquele cacau”, explica Marie Salles.
Em um segundo momento, já casado com Maria Santa (Duda Santos), Inocêncio deixa para trás o visual de “tabaréu” se torna um “coronelzinho”, nas palavras da estilista: “Aí ele já veste umas camisas melhores, em cores mais claras. Depois vem a fase do luto, com tons escuros para dar conta de toda a mágoa do personagem”, conta. Após a passagem do tempo, Inocêncio surge na pele de Marcos Palmeira já com tons algodoados, na inspiração do fazendeiro suíço.
Marie, que também foi figurinista de “Pantanal” (2022), afirma que José Inocêncio tem pouco em comum com José Leôncio, do remake anterior de Bruno Luperi —apesar de serem dois protagonistas, latifundiários e patriarcas, vividos pelo mesmo ator.
“José Inocêncio é muito mais sofisticado e contemporâneo. Ele já usa celular, laptop. É também um homem mais doce, amoroso. Tem amor pela terra, pela Maria Santa, pela Mariana, pelos filhos. O José Leôncio não tinha amor, só rancor”, compara.
Feira da Praça XV
Enquanto um José Inocêncio sofisticado e espelhado no agricultor suíço faz suas contas em um notebook com seus óculos de leitura moderninhos, João Pedro (Juan Paiva) e Zinha (Samantha Jones) trabalham duro na lavoura de cacau vestindo um estilo roceiro, mas também carregado de contemporaneidade.
Para vestir a dupla, Marie passou duas semanas em Ilhéus pesquisando e fotografando os “tabaréus” das fazendas e concluiu que eles vestem principalmente roupas doadas. Para compor a vestimenta desse núcleo, a figurinista levou Juan Paiva e Samantha Jones à feira de antiguidades da Praça XV, no centro do Rio.
“Zinha e João Pedro se completam. Zinha usa camisetas com estampas retrô de coisas da Bahia, Bob Marley, um top que a gente comprou em Madureira e shorts de futebol dos anos 1970 com cintura rebaixada”, descreve. Já o visual de João Pedro, um herdeiro às avessas, com mais pinta de peão do que de dono das terras, veste camisas de futebol velhas, como uma vintage do time do Bahia que Marie conseguiu autorização com o jurídico da emissora para usar.
Em sua pesquisa, Marie notou que a maioria das vestimentas dos trabalhadores tem propagandas, como nomes de farmácias, lojas e políticos, e mandou fazer camisas fictícias imitando o estilo. Escudos de times de futebol falsos também foram criados para compor o figurino de João Pedro. A tática já tinha sido usada por ela em “Avenida Brasil” (2012), com as camisas do Divino Futebol Clube e seus patrocinadores fictícios.
Roupa usada traz ar de verdade
Além da feira da Praça XV, brechós de rua e virtuais são fonte de 70% do guarda-roupa da novela, inclusive dos personagens urbanos, como Eliana (Sophie Charlotte). “Se eu fosse comprar todas as peças de grife que ela usa, estouraria meu orçamento”, brinca Marie. “O mercado de roupa usada é muito amplo e muito importante na construção de um figurino. Tem brechós virtuais que vendem só peças de luxo pouco usadas”, conta.
Do que compra de novo, zero bala, ela prioriza marcas com pegada sustentável e “slow fashion”, além das confecções rainhas do básico como Hering e Gap. “Tento evitar o fast fashion, mas acabo tendo que usar também”, diz.
Foi também em um desses brechós que Marie garimpou o “vestido do Bumba” de Maria Santa por R$ 20. É a roupa que a personagem usa em seu primeiro encontro com José Inocêncio e a que ela permanece usando até o final da novela, em todas as suas aparições como visões do viúvo.
“Eu gosto muito de brechós, de trabalhar com reutilização do material. A gente vê esses brechós pelo mundo afora com toneladas de roupa. Reutilizar é contribuir com um mundo melhor”, defende. Além da sustentabilidade, ela gosta da “cara de verdade” que as roupas usadas trazem. “Vem com bolinha de lavanderia, tem todo um processo de desgaste natural da peça”.
Mariana básica e ambígua
“Mariana se veste como uma mulher de 24 anos no calor da Bahia”, e ponto. É assim que Marie resume o figurino da protagonista vivida por Theresa Fonseca. Uma mulher básica, ambígua, cujo figurino não chama a atenção de ninguém —até porque o mistério, no caso, fica por conta das atitudes inesperadas da personagem.
“A gente não sabe o que ela quer de verdade, se ela se apaixona de verdade”, pontua Marie. “Ela chega de Salvador com roupas muito simples, shortinhos, blusinhas de malha, vestidos usados, depois o José Inocêncio compra roupas para ela, mas o estilo permanece o mesmo”, conta.
“São batas de algodão, um estilo que prioriza o conforto em um lugar muito quente. Um jeito natural de se vestir. Ela não tem maquiagem, o cabelo é solto, reto, pouco escovado. Tudo bem natural”, diz.
Jacutinga tem um quê de Gretchen
Já a personagem de Juliana Paes, a charmosa cafetina Jacutinga, tem figurino inspirado em Gretchen, Sula Miranda e as musas da TV dos anos 1990, que iam ao programa do Chacrinha cantar. “Ela usa boca de sino, corpetes com paetês e canutilhos”, descreve.
Sophie sugeriu look fitness para Eliana
Uma dondoca em 2024 não seria uma dondoca completa sem passar o dia de roupa de ginástica. A observação foi da própria Sophie Charlotte, que vive Eliana no remake, papel que foi de Patrícia Pillar na primeira versão.
“Conheço muitas Elianas. Mulheres ricas e lindas que só olham para a beleza, como se fosse a coisa mais importante. Ela está sempre bem arrumada, maquiada, vestindo grifes e de unha feita. Ela acha que esse homem só está com ela por causa da beleza, então a beleza é tudo para ela”, descreve Marie. “Mas a grande sacada da personagem foi da Sophie”, entrega.
Foi a atriz quem sugeriu que a personagem precisava ser viciada em academia. “Ela falou ‘a Eliana tem que malhar!’. Então a gente misturou a roupa de sair com roupa de ginástica. Ela usa um macacão de malhar por baixo do paletó, por exemplo. Tênis com alfaiataria. A gente conhece essa mulher que vai para a academia e depois para o happy hour encontrar as amigas”, diz Marie. “E quando ela vai para a fazenda, vai ter essa mistura do fitness com a bota de montaria. Mas tudo muito chique”, pontua a figurinista.
Buba não foi inspirada em mulheres trans
Já para vestir Buba, Marie apostou em delicadeza e doçura. E, ao contrário de outras personagens transgênero em novelas, não houve nenhum tipo de pesquisa com o universo trans.
“Não teve pesquisa com mulheres trans. Ela é uma mulher, ponto. Tratamos apenas da personalidade da personagem. A Buba é delicada, doce, fluida. Usa tricô, sapatilhas de amarrar, tons pasteis, saias esvoaçantes com bodies. É um figurino mais lânguido, com essa presença do balé”, descreve.
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Fonte: Uol