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Em seus oito anos de existência, o podcast “Heavyweight” conseguiu encontrar uma identidade própria ao contar histórias de pessoas comuns. Os episódios partem de uma premissa simples e aberta, ajudar alguém a lidar com questões que carrega do passado —medos paralisantes, relações perdidas, ou dúvidas como “será que aquele rapaz gostava de mim no colégio?”.
Há situações em que o objeto que motiva a história já está à disposição, como as fitas cassete encontradas por Toby na casa do pai morto há pouco. Nelas, há horas de conversa entre seus pais, que passavam por uma difícil separação e pela disputa da guarda dos filhos. O rapaz quer ajuda para ouvir as gravações e entender melhor como foi criado.
Em outras, é preciso uma imensa busca para encontrar quem se procura, como a história do ouvinte que está atrás do rapaz que o ajudou quando foi baleado por acidente numa roda de amigos bêbados.
Esses são alguns temas da última temporada da consagrada produção, exclusiva do Spotify há cinco anos, desde que a plataforma comprou a produtora Gimlet. Sem maiores explicações, a empresa sueca decidiu encerrar o podcast no ano passado.
Mas “Heavyweight” se despede mostrando suas maiores virtudes. O podcast segue capaz de algo raro, articular drama com bom humor e autoironia em histórias bem apuradas, sem ser piegas. É também um produto que alterna entre humores com habilidade, seja no roteiro ou na sonorização, nunca intrusiva ou excessiva, mas sempre capaz de contribuir com as sensações evocadas pela narração.
Em geral, os episódios começam com uma contextualização do problema que conduz a narrativa, na maioria das vezes trazido por um ouvinte. No final deste primeiro ato surgem algumas perguntas norteadoras. “O que você quer com isso? O que você espera encontrar?”
Mas para além de encontrar respostas definitivas, a graça está em promover os encontros e ver no que isso pode dar.
Assim, não se pode esperar sempre um final feliz ou com reconciliações —elas até podem acontecer, mas não como um ponto de chegada necessário. O que importa é elaborar as relações dos sujeitos com o objeto de suas angústias e contar o que vier daí. Difícil não lembrar um processo terapêutico.
O episódio inaugural desta temporada derradeira é uma volta às origens. Tal como no início de toda a série, é uma história ligada ao apresentador principal e criador do show, Jonathan Goldstein. Aqui, ele fala de Lenny, seu melhor amigo de infância. Foi com ele quem cultivou uma intimidade criativa, partilhou primeiro seu gosto pelo rádio e o fato de ser depressivo.
Mas ambos se afastaram no correr da vida e, agora, o comediante judeu deixa a recorrente autoironia de lado para falar da difícil retomada de contato com Lenny anos depois, quando a cumplicidade de outros tempos se foi.
Casado, com um filho e uma carreira estabelecida, Goldstein descobre o antigo amigo ainda no porão da casa da mãe no subúrbio em Montreal, solitário, em meio a vícios e um câncer terminal.
É um mergulho sem precedentes na vida do apresentador, de quem o ouvinte antigo já se sente íntimo. Mas mesmo recém-chegados se sentirão envolvidos pela dura pergunta que percorre o episódio —o que é possível obter de um reencontro após tantas perdas?
Se o trabalho de mediação dá a “Heavyweight” seu peso emocional, o processo de viabilizar esses reencontros gera pequenas aventuras, com buscas que parecem impossíveis.
É o caso dos irmãos Ted e Todd, que recorrem ao podcast para reencontrar Harry, companheiro dos últimos dias de vida do irmão mais novo, Scott, morto há anos em decorrência da Aids. Foi Harry quem esteve mais próximo de Scott em seus últimos dias, se tornando agressivo com sua perda.
Ocorre que Harry é uma arara vermelha. Após a morte de Scott, a família não conseguiu cuidar da ave e a acabou doando para alguém de quem nem se lembram mais. Reencontrar o pássaro seria uma forma de reaver contato com a única coisa que Scott pediu que cuidassem e eles não foram capazes.
A busca pelo pássaro é hilária e absurda. Quando uma ave preenche requisitos o bastante, a família de Scott e Jonathan viajam até o Arizona para o esperado reencontro.
Não espanta que, em oito anos de existência, “Heavyweight” tenha “apenas” 58 episódios regulares, além de extras mais curtos. É frequente que histórias demorem meses para se desenrolar, seja pela dificuldade de se encontrar quem ou o que se procura ou pela resistência dos próprios sujeitos em se envolverem com o que propuseram.
Um programa do tipo demanda investimento grande de recursos financeiros e, sobretudo, de tempo —recursos escassos no mercado de mídia, ainda mais para formatos longos e com baixa frequência de publicação.
Mas é em tom otimista que Golstein fala do encerramento do programa no episódio final, deixando entender que há busca por uma nova casa. Estaremos em mal caminho se não houver quem abra logo as portas para essa equipe.
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Fonte: Uol