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Para fazer frente à concorrência e se adequar à regulamentação do streaming em curso no Brasil, a Netflix investiu R$ 1 bilhão na produção de filmes e séries nacionais em 2023 e 2024. É dois terços do valor empenhado na soma dos 12 anos anteriores, desde sua chegada ao país.
Se, por um lado, a estratégia facilita a conquista do público local, por outro, as produções brasileiras também vêm ganhando o mundo e já estiveram entre as mais vistas da plataforma em 89 países, revela levantamento inédito da Folha.
Ao todo, 49 obras brasileiras entraram pelo menos uma vez no top 10 semanal do serviço em algum território estrangeiro entre julho de 2021 e janeiro de 2024, período com dados disponíveis. A análise inclui todas as produções nacionais do catálogo, originais ou licenciadas.
O principal destaque é o thriller erótico “O Lado Bom de Ser Traída”, do ano passado, sobre uma jovem que descobre a infidelidade do noivo às vésperas do casamento. Com nudez e classificação indicativa de 18 anos, o longa ficou entre os mais vistos em 86 países e chegou à primeira posição da categoria em 27 deles, como Arábia Saudita, Grécia, Indonésia, Israel, Itália, Nigéria e Romênia.
Já “DNA do Crime”, uma das séries mais caras produzidas pela Netflix no Brasil, segundo a empresa, figurou entre as preferidas do público em 73 países, chegando ao topo da categoria em 21 deles. Também lançada em 2023, a trama é inspirada na história de um roubo real na fronteira com o Paraguai.
Elisabetta Zenatti, vice-presidente de conteúdo da Netflix no Brasil, afirma que o sucesso internacional das produções é uma “caixinha de surpresa”, mas pode estar relacionado à popularidade universal de certas temáticas. “Sabemos que alguns gêneros viajam melhor, como ação, que atrai diversos públicos. ‘DNA do Crime’ é um exemplo”, diz.
Segundo a executiva, a empresa não impulsiona títulos nas páginas da plataforma, mas o escritório de São Paulo pode identificar obras com potencial internacional e alertar outras regiões, pedindo atenção à publicidade dos lançamentos.
Os rankings nacionais da Netflix não separam as produções segundo o idioma (inglês ou outro), diferentemente do top 10 global. Se uma obra brasileira é a mais vista da respectiva categoria (filmes ou séries), significa que superou concorrentes americanas, britânicas e de todas as demais origens com indústrias mais estabelecidas no audiovisual.
Chegar ao primeiro lugar é um feito raro. O filme “Esposa de Aluguel” e as séries “Carrossel”, “Sintonia” e “Olhar Indiscreto” completam a lista das únicas produções brasileiras que alcançaram o topo em ao menos um país estrangeiro no período analisado.
Por outro lado, alguns rostos já colecionam hits no exterior. Um deles é o da atriz Larissa Manoela, referência no segmento infanto-juvenil alçada à fama ao interpretar Maria Joaquina na versão brasileira de “Carrossel”.
Além da novela produzida pelo SBT e disponível na Netflix, ela é a protagonista de “Lulli”, um dos primeiros longas nacionais com êxito mundial na plataforma. A fantasia sobre uma estudante que consegue ler pensamentos entrou no ranking de popularidade de 39 países, incluindo locais inesperados, como as Ilhas Maurício, no Oceano Índico, e a Nova Caledônia, território francês na Oceania.
Larissa estrelou também o original “Diários de Intercâmbio”, um dos dez filmes mais vistos em Portugal e no Paraguai na época do lançamento. Esteve ainda nas novelas “As Aventuras de Poliana” e “Cúmplices de um Resgate”, sucessos entre os lusitanos.
Outro fenômeno da Netflix fora do Brasil é o humorista Leandro Hassum, que emplacou quatro títulos entre os mais populares de ao todo 29 territórios diferentes —”Amor Sem Medida”, “Vizinhos”, “B.O.” e “Meu Cunhado é um Vampiro”, lançados entre 2021 e 2023.
“A gente sabe que vão estar no cardápio de todos os países, mas nunca imagina que nossas histórias, tão locais, terão uma identificação em lugares como Sérvia, Trinidad e Tobago, Eslováquia, Suíça ou Marrocos”, comenta Hassum.
O humorista acredita que a identificação do público com os personagens é um elemento central para a aceitação. Ele cita como exemplo a ingenuidade e o bom coração do delegado Suzano, da série “B.O.”. “Tem um apelo essa questão de acreditar no bem, a esperança de que existem pessoas boas, que ainda têm sentimento. Isso ultrapassa as fronteiras.”
“A gente sabe que vão estar no cardápio de todos os países, mas nunca imagina que nossas histórias, tão locais, terão uma identificação em lugares como Sérvia, Trinidad e Tobago, Eslováquia, Suíça ou Marrocos”
Larissa Manoela faz uma avaliação parecida. “Ao assistir, o público consegue se identificar e tirar uma lição do filme”, afirma a atriz, sobre “Lulli”. “Fico muito surpresa ao saber que meu trabalho tem chegado a lugares tão distantes da minha cultura.”
O sucesso no exterior também pode ser atribuído à familiaridade com produções brasileiras —um reflexo da exportação de novelas—, além da oferta limitada de conteúdos próprios em algumas regiões, afirma Pedro Curi, coordenador do curso de cinema e audiovisual da Escola Superior de Propaganda e Marketing (ESPM).
“Se você tem uma movimentação grande de uma produção sendo muito vista no Brasil, há grande chance de ela aparecer em algum ranking internacional e conquistar as pessoas que seguem as sugestões da plataforma”, afirma Curi, ressaltando que o país é o segundo maior mercado da Netflix em número de assinantes.
Elisabetta Zenatti diz que não há uma diretriz da empresa para investir em narrativas com apelo universal. Pelo contrário. “Temos que cuidar da audiência nacional, não nos preocuparmos se o título viaja ou não. A audiência reconhece o sabor local, como aconteceu com ‘Round 6’. Há um paralelo com o Brasil no aspecto social: você entende que aquelas brincadeiras são muito coreanas, mas mesmo assim curte.”
De acordo com a classificação de gêneros feita pelo site IMDb, especializado na indústria audiovisual, as produções brasileiras mais apreciadas pelo público estrangeiro são as de comédia e drama. Obras de romance e sobre crimes aparecem em seguida.
O alcance de “O Lado Bom de Ser Traída” surpreendeu a roteirista do filme, Camila Raffanti. Embora o sucesso de histórias eróticas seja mundial, principalmente no formato literário, ela diz acreditar que o diferencial da produção foi mergulhar com intensidade nas emoções que ele desperta.
“O resultado mostra que as temáticas da sexualidade, traição, paixão e superação são muito fortes e universais, isso faz com que as pessoas queiram se ver retratadas. São acontecimentos que tocam muita gente”, afirma.
Desde julho de 2021, a Netflix divulga as produções mais vistas a cada semana em 94 países. O top 10 global tem quatro categorias —filmes em inglês, filmes em outros idiomas, séries em inglês e séries em outros idiomas, totalizando 40 títulos—, enquanto os rankings nacionais têm apenas duas —filmes e séries, sem distinção de idioma, com 20 produções ao todo. Parte das obras já saiu do catálogo.
Para identificar conteúdos brasileiros, a Folha cruzou os nomes de todas as 6.742 obras ranqueadas em qualquer país, posição ou semana com os cerca de 38 milhões de títulos originais e regionais existentes na base de dados do IMDb.
Uma vez identificadas as produções homônimas e os respectivos países de origem, foi preciso realizar uma filtragem manual para verificar se os títulos nacionais eram os mesmos disponibilizados na plataforma, já que a oferta varia entre os países.
Colaborou Leonardo Sanchez
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Fonte: Uol