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A série “The Chosen – Os Escolhidos” é um dos projetos de financiamento coletivo do setor de entretenimento mais bem sucedidos até hoje.
Seus produtores afirmam que o apoio dos espectadores, ao longo das quatro temporadas já produzidas, cobriu cerca de US$ 100 milhões (cerca de R$ 492 milhões) em despesas de produção.
Mas muitas pessoas que não são cristãs, principalmente fora dos Estados Unidos, talvez nunca tenham ouvido falar de “The Chosen”, a primeira série de TV com múltiplas temporadas sobre Jesus Cristo, contada pelos olhos dos seus discípulos, seguidores e adversários.
Isso porque, inicialmente, ela só era disponível na sua própria plataforma ou em outros veículos ligados ao cristianismo.
De um pequeno piloto em 2017, criado pelo cineasta americano Dallas Jenkins, e com US$ 11 milhões (cerca de R$ 54,1 milhões) de doações iniciais, “The Chosen” passou a ter seu próprio aplicativo. E, hoje, também é oferecida por serviços de streaming, como a Netflix.
Segundo seus produtores, a série já teve 200 milhões de espectadores únicos desde o seu lançamento, somando todas as plataformas.
Sua quarta temporada acaba de ser lançada em eventos espetaculares em Los Angeles, nos Estados Unidos, e em Londres, seguida por uma versão compacta para os cinemas.
As versões das temporadas anteriores para o cinema renderam cerca de US$ 35 milhões (cerca de R$ 172 milhões) de bilheteria nos Estados Unidos. E o ator que interpreta Jesus, Jonathan Roumie, já se encontrou com o papa Francisco duas vezes para comentar sobre a série e sua interpretação de Jesus.
Nas três primeiras temporadas, Jesus forma seu círculo de discípulos, faz o chamado “Sermão da Montanha”, cura diversas pessoas (incluindo uma mulher que passou 12 anos com hemorragias), traz a filha de Jairo de volta dos mortos e anda sobre a água —trechos da filmagem publicados nas redes sociais mostram como os cineastas recriaram o milagre.
Abordagem moderna
É claro que Jesus Cristo já foi retratado muitas vezes, na tela e no palco.
Algumas interpretações notáveis são as de Ted Neeley em “Jesus Cristo Superstar” (1973) e Jim Caviezel no ultraviolento, mas ultravitorioso “A Paixão de Cristo” (2004) —sem falar na minissérie de TV de Franco Zeffirelli, “Jesus de Nazaré” (1977).
Martin Scorsese declarou recentemente ter concluído outro roteiro sobre Jesus.
Ele foi o diretor do controverso filme “A Última Tentação de Cristo” (1988), que mostra Jesus contemplando a possibilidade de uma vida comum com Maria Madalena.
“[A série] “Nos Bastidores do Poder” foi uma inspiração para nós porque é sobre a presidência. Os personagens giram em torno do presidente, mas ele é um dos cinco ou seis personagens abordados. Pensamos que o que você aprende quando lê os evangelhos é que Jesus tem esse impacto sobre muitas pessoas.”
O desenvolvimento dos personagens gerou interpretações modernas dos diálogos e histórias. Isso é observado no personagem de um dos discípulos, o evangelista Mateus, retratado como um homem autista.
Mas, ao contrário de algumas das produções anteriores (como “Jesus de Nazaré”, com Robert Powell no papel principal, com seus olhos azuis), “The Chosen” tem um elenco diversificado, que inclui atores de origem judaica, árabe, do sudeste asiático e do norte da África.
A história é baseada na vida e nos costumes judeus da época que, às vezes, são encobertos nas representações da vida de Jesus. Cristo e seus discípulos são encontrados em sinagogas e comemoram os festivais judaicos, como o Sucot.
“Existem muitos filmes e minisséries sobre Jesus e assisti à maioria deles”, conta Dallas Jenkins à BBC.
“Mas nunca houve uma série com várias temporadas, com tempo para desenvolver as histórias, os personagens, as histórias secundárias, em que você consiga realmente explorar a humanidade dessas pessoas. O motivo por que adoramos as séries longas é porque podemos investir nos personagens, no desenvolvimento da história e isso nunca foi feito antes em um projeto sobre Jesus.”
Católico devoto, Jonathan Roumie diz sobre Jesus: “Você não pode excluir suas origens judaicas.”
“É fundamental que tudo o que ele fez cumprisse as profecias da cultura judaica do seu tempo. Por isso, acho que fingir que [a origem judaica] não está lá é um desserviço para ele e para a história.”
Jenkins espera que o tom de “The Chosen” seja mais humano e bem-humorado que o tradicionalmente adotado pelos programas religiosos.
“Gostamos de dizer que estamos retirando Jesus das estátuas e dos vitrais.”
“Acho que estamos retirando o véu e os muros que, às vezes, colocamos entre nós e o Jesus autêntico”, explica Jenkins. “Temos muitas partes do programa que não são extraídas diretamente das escrituras, mas acredito que estamos capturando com precisão o caráter e as intenções de Jesus nos evangelhos.”
“E realmente acho que isso favorece as pessoas que não acreditam e que irão gostar da série. Elas simplesmente pensam: ‘OK, não parece tão assustador, devoto, religioso, tentando me vender alguma coisa, parece mais um drama histórico’.”
Mas “The Chosen” também tem intenções evangelizadoras. Seus criadores formaram uma fundação que pretende maximizar as doações e aumentar o orçamento das temporadas futuras da série, que deverá ser dublada e legendada em 600 idiomas.
É possível assistir à série gratuitamente no aplicativo e no site, mas existe a opção de fazer doações para a produção.
As cenas da segunda temporada que mostram Jesus no Sermão da Montanha não foram aprovadas por alguns espectadores, nem as cenas de Maria Madalena retornando temporariamente à sua antiga forma de vida.
Existe a crença generalizada de que Maria Madalena teria sido prostituta antes de conhecer Jesus, embora isso não seja mencionado nos evangelhos. E alguns cristãos também acreditam que retornar ao antigo modo de vida contradiz a mensagem da salvação.
Jenkins também precisou se colocar sobre uma fala da terceira temporada, na qual Jesus diz: “Eu sou a lei de Moisés”.
Alguns espectadores acharam que a série estaria apresentando teologia do Livro de Mórmon, que traz uma referência aparentemente parecida. Jenkins negou que a similaridade no roteiro fosse intencional.
A série também não está livre da politização do cristianismo —especialmente nos Estados Unidos, onde as ideias religiosas sobre a legalização ou não do aborto e a inclusão de pessoas LGBTQIA+ nas igrejas fazem parte do debate dominante.
Surgiram muitas controvérsias no ano passado quando foi encontrada a bandeira do arco-íris, um dos principais símbolos da comunidade LGBT, sobre um equipamento no set de filmagem.
“A série não é política”, explica Jenkins. “Não tenho nenhum objetivo político.”
“É por isso que permitimos a liberdade de expressão no nosso set, pois o nosso elenco e a equipe vêm de todo tipo de ambientes, sejam eles políticos, espirituais ou não. E, se eles quiserem vestir camisetas ou manter objetos sobre seu equipamento pessoal, é problema deles.”
“Não acho que a série possa evitar que o público atribua certas politizações, mas isso simplesmente está fora do meu controle”, prossegue ele. “Por isso, temos pessoas que me acusaram de ser feminista liberal e tive pessoas que me acusaram de ser extremista de direita.”
Fenômeno americano?
Embora seus produtores afirmem que a série teve 600 milhões de visualizações em suas diversas plataformas, a popularidade de “The Chosen” não significa necessariamente que exista uma nova era de programas religiosos à nossa frente.
O filme “Som da Liberdade” (2023), distribuído pela Christian Angel Studios —uma das plataformas que oferece “The Chosen”—, teve imenso sucesso nos cinemas americanos no ano passado.
A produção chegou a atingir, em média, bilheterias de US$ 1 a 3 milhões (cerca de R$ 4,9 a R$ 14,7 milhões) nos cinemas em países como a França, a Espanha, o Reino Unido e a Holanda.
Mas esses valores podem ter sido favorecidos pela publicidade que associou o roteiro sobre o tráfico de crianças à teoria da conspiração QAnon. E houve também, nos Estados Unidos, uma opção chamada “pague para alguém”, que permitiu que os espectadores comprassem entradas adicionais para que outras pessoas as retirassem de graça.
No Brasil, o filme foi promovido por grupos autodefinidos como conservadores e também incluiu a distribuição gratuita de ingressos.
Mas, em outros casos, as produções de conteúdo cristão costumam ter dificuldades fora dos Estados Unidos.
Tom Lashley, da empresa de análise da indústria cinematográfica Gower Street, afirma que filmes como “Movimento de Jesus” (“Jesus Revolution” em inglês, 2023), também estrelado por Jonathan Roumie, faturou mais de US$ 50 milhões (cerca de R$ 246 milhões) na América do Norte, mas apenas cerca de 200 mil libras (cerca de R$ 1,25 milhão) no Reino Unido.
“Os filmes com temática na fé, particularmente as produções americanas, realmente não conseguem grande bilheteria fora dos Estados Unidos e do Canadá, mesmo em países europeus predominantemente católicos, como a Espanha e a Itália”, diz ele.
“O motivo pode ser porque filmes religiosos como ‘Movimento de Jesus’, ‘Eu Só Posso Imaginar’ (2018) e ‘Deus Não Está Morto’ (2014) são especificamente americanos e não se transportam para fora dos Estados Unidos.”
Até o momento, a bilheteria de ‘The Chosen’ na Europa é pequena.
Segundo a Gower Street, o lançamento do sétimo e do oitavo episódio da terceira temporada no Reino Unido, um ano atrás, rendeu 53 mil libras (cerca de R$ 331 mil). Mas a série começa a ter repercussão fora dos Estados Unidos, nas plataformas de streaming.
Na Netflix, “The Chosen” foi a quarta série de TV mais assistida no Brasil e ficou no Top 10 de toda a América Latina durante o período natalino de 2023, segundo os diretores da série.
“Costumo descrever esta série como um estilo europeu de filmagem, é um pouco mais natural”, afirma Jenkins. “Meu diretor cinematográfico é grego e seu estilo traz este tipo de abordagem.”
“Acho que nosso estilo é europeu no roteiro e na filmagem, nós não corremos em direção a respostas fáceis. Esperamos que, de forma lenta, mas confiante, o público de outros países comece a apreciar a série, dizendo: ‘Não parece um projeto de Jesus polido para crianças, parece algo real e natural’.”
É claro que o apelo de “The Chosen” talvez se resuma ao fato de que um retrato bem escrito de Jesus como personagem sempre tem um grande potencial de audiência entre os fiéis.
A página da série no Facebook, por exemplo, tem 3,8 milhões de seguidores. As interações e comentários indicam que a maioria deles aparentemente segue a fé cristã.
Segundo Jenkins, o fato de que a história não pode prosseguir indefinidamente é um dos pontos fortes do conceito. Ele afirma que a série sempre foi planejada para ter sete temporadas.
“E o ponto onde estamos agora é o início do fim”, segundo ele.
“Acho que a sexta temporada, que é a semana da crucificação, será muito mais poderosa do que talvez muitos retratos que já vi no passado, porque agora existe a identificação do público com as pessoas envolvidas”, prossegue o criador da série.
“Não preciso sequer mostrar sangue e vísceras para que nos emocionemos ao ver Jesus, seus amigos, sua mãe passando por tudo aquilo. Só espero que possamos conseguir atravessar isso juntos.”
“The Chosen – Os Escolhidos” está disponível no Brasil na Globoplay (primeira temporada) e na Netflix (três temporadas). A quarta temporada da série chega aos cinemas brasileiros em março, segundo o site oficial.
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Fonte: Uol